Ao vivo - Super Rock In Lisbon
SUPER ROCK IN LISBON
29.05.03 - Estádio José de Alvalade, Lisboa
29.05.03 - Estádio José de Alvalade, Lisboa
O Estádio José de Alvalade, habitual palco de grandes espectáculos musicais, acolheu pela última vez um grande evento, contando com as prestações de grandes bandas, tais como, Primitive Reason, Disturbed, Audioslave, Deftones e Marilyn Manson. Deu-se a abertura das portas pelas 15h00, estando previsto o início do espectáculo para as 17h00, facto este que acabou por não se verificar. Não se entendeu se o atraso foi estratégico ou se foi mera manobra de charme. A verdade é que, infelizmente, por uma razão ou por outra, a grande maioria dos espectáculos realizados em Portugal sofrem atrasos.
Os Primitive Reason abriram o cartaz e fizeram-no de uma maneira bastante competente. O público vibrou com temas como "Alternative Prison", "Seven Fingered Friend", "The Sage", "Beat Down", assim como com alguns dos temas mais intensos do novo album "The Firescroll", ou pelo menos tocados com mais intensidade. Excepção feita aos muitos presentes vestidos de negro que tornaram óbvio pelo ruído despropositado sentido entre as pausas das músicas. Isto sem querer ser preconceituoso, é claro. Com uma qualidade sonora que impressiona pela criatividade e originalidade com que a banda funde ska, reggae, metal, dub, ritmos tribais, música africana e rock de uma forma muito própria, resultado de uma confluência e cruzamento de culturas do mundo, ou não fosse a mesma composta por um guitarrista e baixista luso-americanos (os irmão Abel e James Beja, novos elementos), um baterista nascido na Suíça (Jorge Felizardo) e um vocalista oriundo de Madrid (Guillermo de Llera). A experiência adquirida pela banda na sua digressão pelos Estados Unidos e o facto de terem feito a primeira parte dos concertos dos Misfits, por várias vezes, que segundo Jorge Felizardo são os pais dos Marilyn Manson, bem como as provas dadas, justificam plenamente a escolha desta banda para abrir este super cartaz.
A segunda banda a entrar em palco foram os Disturbed, começando por tocar o single do novo álbum «Believe» e aproveitando o interregno entre as duas primeiras músicas para estabelecer uma ligação com o público presente, tocando posteriormente temas dos seus dois álbuns, "The Sickness" e "Believe". David Draiman, vocalista, incitou o público com uma afirmação de empatia para com um público desconhecido “My blood of Portugal, let me hear your voices”, prosseguindo com “let me feel your strenght” surtindo efeito temporário entre muitos dos presentes, já que pecou por usar e abusar da mesma fórmula. Ficou-se com a sensação que a música dos Disturbed assente num metal de acordo com o formato praticado pelas bandas de metal clássicas e envolvendo temáticas também muito próximas deste tipo de metal, foi talvez incompreendida por muitos dos presentes já que, com o desenrolar do concerto e insistentes incitações por parte de David Draiman, o típico mosh deu origem ao arremesso de porções do relvado entre o público, chegando mesmo a ir parar ao palco alguns pedaços de relva. É de salutar, no entanto, a atitude da banda que só interrompeu o espectáculo após algumas tentativas de invasão do palco. Foi, enfim, uma boa actuação do grupo de Chicago.
De seguida subiu ao palco a superbanda intitulada Audioslave que julgo dispensar apresentações entre os leitores. Os ex-elementos dos Rage Against The Machine e Chris Cornell começaram o concerto envoltos por uma grande salva de palmas, que se aprontaram a agradecer logo após o final da primeira música. A superbanda fez estremecer os alicerces do decadente estádio José de Alvalade com alguns temas do seu álbum homónimo, tais como "Show M How To Live» e "Cochise" (primeiro single), e com o estilo inconfundível e único de Tom Morrello a tocar guitarra. Embora tenham dado um bom espectáculo e se tenham divertido a tocar, não deixando os seus créditos por mão alheias, é de salientar algumas tentativas fracassadas de criar empatia com o público por parte de Chris Cornell (embora tenha admitido ter gostado mais do público e do ambiente que há década e meia atrás, quando ainda tocava nos Soundgarden), rapidamente colmatadas por Tom Morello ao tomar a iniciativa de começar a tocar e solar de forma simplesmente brilhante, fazendo lembrar RATM com alguns riffs poderosos assumindo-se, a meu ver, como líder da banda. Ficamos pois à espera de um próximo concerto em Portugal, quiçá ainda mais explosivo e com novo álbum em estreia. Serão sempre bem-vindos.
Na opinião de grande parte dos presentes no evento, o momento da noite estaria reservado para a actuação dos Deftones, facto que acabou por ser confirmado uma vez que Marilyn Manson (cabeça-de-cartaz), desiludiu um pouco, pois esperava-se um espectáculo mais dinâmico. Um concerto dos Deftones é, por si, só uma experiência fora do comum, então quando reunidas as condições ideais, num ambiente recheado de fãs a “sentir” as melodias e vibrar com a pujança que a banda incute nas músicas que produz, torna-se, a meu ver, algo único. Quando a banda subiu ao palco já se fazia sentir a adrenalina que paira no ar antes dos grandes eventos, com grande parte do público a aclamar o nome da banda, até que... começou a experiência! A banda da Califórnia deu um espectáculo simplesmente genial, com uma actuação, na ausência de palavras que melhor a definam, simbiótica! A música dos Deftones (diferente, original, precursora, carregada de criatividade e de algo dinâmico) conjuntamente com uma voz de Chino Moreno (única, completa a todos os níveis e muito fora do vulgar) consegue despertar emoções e transmitir sentimentos, levando a um estado de espírito diferente, para quem sente, é claro. A dada altura do concerto, Chino dirigiu-se ao público com “I´m leaving, I´m leaving the stage, cos the stage is for loosers” e abandonou o palco para cantar entre e com os fãs, e só não foi cantar literalmente para lá das grades de protecção, porque os seguranças o impediram. Posteriormente, tapou os olhos com uma fita oferecida por um dos fãs, subiu o palco, cantou cerca de quatro temas, e voltou a descer o palco, só retirando a fita ao se reencontrar de novo com os fãs. Ainda houve espaço para convidar um fã dos Soulfly a subir ao palco para cantar "Headup" consigo, tema que canta com Max Cavalera no álbum "Around The Fur” e que acabou por ser mediocremente interpretado pelo respectivo fã. Foram ainda destaque temas como, "Minerva", "Be Quiet And Drive", "My Own Summer (Shove it)", "Mx", "Bored" e "Back To School". Esta actuação não ficou nada atrás das duas anteriores passagens por Portugal, pelo festival Ilha do Ermal 2000 e, em dose dupla, na edição do Super Bock Super Rock de 2001.
Quanto a Marilyn Manson, como já foi referido atrás, desiludiu um pouco já que se esperava um espectáculo mais dinâmico. Através do concerto, foram expostas as posições político-sociais e religiosas, a negação das mesmas pela negatividade do mundo, e o corte com todas as ligações do artista ao passado através das músicas de "Antichrist Superstar»", "Mechanical Animals", "Holy Wood (In The Shadow Of The Valley Of Death)", e também de músicas do mais recente álbum à data "The Golden Age Of Grotesque". Ficou mais que provado que Marilyn Manson nasceu para pisar o palco, dando bom concerto com uma presença em palco, no mínimo, extravagante. Ainda ia o concerto a meio, quando muitos dos presentes começaram a abandonar o recinto. Resta esperar que no próximo ano se volte a realizar o evento, com a participação de grandes bandas. Até lá...
João Espinha