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Entrevista Anomally

CUSPIDOS PARA O INFERNO

O “inferno vulcânico” açoriano abriu-se para libertar aquela que será, sem grande margem para dúvidas, uma das maiores promessas do Metal regional. Três anos de gestação apenas foram precisos para que os Anomally se afirmassem no meio açoriano, com participações nos maiores festivais de metal locais e ainda com a distinção de “Melhor Banda Rock/Metal” nos “Prémios Música Açores 2007”. Agora foi a vez de nos darem a conhecer o seu álbum de estreia. “Once In Hell…”, um conjunto de 8 temas plenos de consistência, suturados num tecido estampado pela melodia e obscuridade do gótico, a raiva do death metal e o peso do thrash, prometem honrar a bandeira açoriana além-fronteiras e para o próprio grupo é a garantia de um futuro risonho. O teclista Miguel Aguiar explica-nos as “ferramentas” do sucesso dos Anomally.

Se a memória não me falha, os Anomally são a banda de Metal açoriana a alcançar mais subitamente a marca do primeiro álbum. Poder-se-á dizer que há algum “segredo” por detrás disso?
Na nossa curta existência praticamente tudo aconteceu rapidamente. Temos desde o início apostado em objectivos bastante rigorosos e que tentamos sempre seguir à risca. Para o terceiro ano apostámos em gravar um CD o que deixou algumas pessoas surpreendidas. O “segredo” é bastante simples: trabalho, muito trabalho, persistência e, acima de tudo, fé em nós próprios e deixar de ter o “pensamento açoriano” que é o de não ser possível realizar-se os nossos sonhos apenas por vivermos isolados geograficamente.

Sentem-se por isso, e talvez por outras coisas, um exemplo a seguir?
Bem, isso julgo que só os outros poderão dizer.

Imagino os Anomally como um grupo de personalidades astuto que sabe bem das dificuldades impostas pela realidade periférica dos Açores e que, por isso, está consciente de que a “batalha” tem que ser travada com outras “armas”. E que “armas” serão essas?
A idade já começa a pesar [risos] e devido a isso temos, provavelmente, uma outra maneira de ver as coisas e de trabalhar. Penso que o simples facto de no início de cada ano estabelecermos os nossos principais objectivos é notório disso. A insularidade é um factor que para muitos acaba por afectar e nós não estamos imunes a isso. Felizmente, hoje em dia, a realidade já é um pouco diferente, os contactos são muito mais fáceis de se conseguir, a internet acaba ter um papel fundamental na tentativa de quebrar essa barreira geográfica a que estamos cingidos; nem tudo é mau no mundo cibernauta. Esta será a principal “arma” com que vamos atacar, a divulgação ao máximo do nosso CD através da internet, o que já tem gerado alguns resultados positivos.

Embora os handicaps subjacentes a ser-se músico nos Açores sejam uma realidade, pelo menos parcialmente, não acha, contudo, que isso gera, por vezes, comodismo da parte dos artistas locais? Sentem ou sentiram, de facto, algumas condicionantes ou algumas delas fazem já parte de um mito?
Infelizmente, sou dessa opinião. Penso que ainda existe muito o tal “pensamento açoriano” que há pouco referi. Algumas pessoas ainda pensam que pura e simplesmente não é possível fazer-se determinadas coisas apenas por se ser açoriano. Não nego o facto de haver algumas condicionantes no facto de sermos músicos nos Açores, nós próprios fomos “vítimas” de certas condicionantes. Não foi possível gravar no estúdio que realmente queríamos, tivemos de optar por um estúdio local, mas lá está, já existem alternativas nos Açores.

Ficam surpreendidos de alguma forma pela fácil “rendição” do público açoriano ao vosso trabalho, ainda mais quando se reconhece algum “bairrismo” entre ilha Terceira e S. Miguel? [risos]
Será que as bandas de Metal inglesas não são bem recebidas pelos alemães? [risos] Esse “bairrismo” de que se fala acaba por ser estúpido quando se trata de Metal. Somos tão poucos e cada vez somos mais descriminados por quem não compreende este estilo de vida…. Então porque havemos de nos odiar uns aos outros só porque uma banda é da ilha X ou Y? Até agora o público micaelense sempre nos acolheu bem aquando das nossas deslocações tanto para o festival Alta Tensão como para o Festival Internacional de Metal ou para o Beer Metal Fest e é para nós sempre uma enorme alegria deslocarmo-nos a S. Miguel para tocar e conviver com amigos e pessoal de outras bandas que ao longo destes dois anos temos vindo a conhecer.

Na Terceira o contingente metaleiro é ainda mais reduzido do que em S. Miguel. Como vão sobrevivendo?
Sobrevivemos bem. É evidente que acaba por ser desanimador dar concertos para 50 ou 60 pessoas, mas não é isso que nos vai fazer desistir e, independentemente, de termos à nossa frente 10 ou 200 pessoas damos sempre o nosso melhor em palco. Afinal de contas estamos nisto primeiro para nos divertirmos e depois para satisfazermos quem ainda se dá ao trabalho de ir aos nossos concertos.

Hoje em dia, e apesar de tocarem Metal, sentem um carinho e admiração especiais da parte dos vossos conterrâneos pelos feitos que alcançaram?
Sem dúvida que sim. Quem nos segue de perto ou de relativamente perto, sabe bem todo o trabalho que temos tido para conseguirmos chegar onde chegámos. Hoje, independentemente de gostarem ou não do género musical que tocamos, são capazes de dar o seu apoio.

“Once In Hell…” está disponível para encomenda na internet. Pelas potencialidades deste meio de comunicação, como, aliás, já referiu, pode-se dizer que já tiveram algumas boas surpresas em termos de solicitações, não é verdade?
Sim, lançámos o CD no dia 31 de Outubro e, curiosamente, no dia 3 de Novembro tínhamos uma encomenda de um CD para alguém de Tokio! [risos]

Como reagiram?
Bem, quando o Tiago disse-me que nos tinham encomendado um CD de Tokio pensava que ele estava a gozar comigo e ri bastante, mas a verdade é que não estava a gozar. [risos] Foi uma grande surpresa para todos nós esta encomenda, pois nunca iríamos imaginar que alguém em Tokio fosse querer um CD nosso quando, por exemplo, na nossa própria ilha estão constantemente a perguntar se o CD é oferta ou se vão ter de “sacar” da net…

O facto de “Once In Hell…” ter saído pelos vossos próprios meios fez também parte de uma estratégia? Foi algo decidido desde o início?
Em certa parte, sim. Obviamente que seria mais cómodo optar por arranjar logo à partida uma editora que financiasse esta gravação, mas o que decidimos foi que iríamos gravar pelos nossos próprios meios e só depois com este CD tentaríamos chamar a atenção de alguma editora.

Para um próximo trabalho conseguir um “selo” é manifestamente importante ou se não o conseguiram vão continuar naturalmente o vosso caminho?
O nosso maior objectivo ao gravar este CD foi o de conseguir, como já disse anteriormente, captar a atenção de alguma editora. Portanto, é um desejo quase que óbvio editar um próximo álbum através de uma editora, mas quanto a isso estamos conscientes que não será fácil. Existem muito boas bandas por todo o mundo, nós somos apenas mais uma. Caso este cenário não seja possível, avançaremos para o próximo mais uma vez pelos nossos próprios meios. Não será por aí que os Anomally vão parar.

Já existem reacções aos discos promocionais que têm enviado para as editoras e media?
Praticamente, tudo o que fazemos é de alguma maneira premeditado. Nesta primeira fase estamos apenas a enviar o disco para os media só então depois enviaremos para editoras. Quanto a reacções até agora têm sido bastante positivas e alguns, inclusive, oferecem-se com toda a vontade para nos ajudar a promover a banda.

Ainda que “Once In Hell…” seja um álbum, comporta apenas 33 minutos de música. Não houve a intenção de aguardarem mais um tempo e reunirem/comporem mais alguns temas?
Nós achámos que este era o momento indicado para gravarmos este álbum. Tínhamos alguns temas dos quais foram estes os escolhidos para fazerem parte do álbum. Achámos que eram os que melhor representavam o que somos e apesar de ser apenas 33 minutos isso pode ser um ponto a favor, pois quantas vezes já não aconteceu ouvirmos um álbum que tem cerca de 60 minutos e os últimos temas deixam-nos com a sensação de que podiam bem ser dispensados?

Embora um “perfume” gótico emane de sobremaneira do vosso trabalho, não seria só assim que descreveria o som dos Anomally às pessoas, pois não?
De maneira alguma. O som dos Anomally surge um pouco fruto das influências individuais de cada membro da banda que vão desde o gothic ao death metal e até mesmo ao thrash. Vamos buscar influências das bandas que crescemos a ouvir e também aproveitamos aquilo que de bom se faz hoje em dia.

O liricismo de “Once In Hell…” tem uma forte componente/inspiração religiosa. São “rapazes” de pouca fé, pelo que consta… [risos]
Já tivemos mais fé, realmente. [risos] O povo português é, por norma, um povo religioso. Cerca de 85% da nossa população é católica e como tal fomos criados em raízes católicas. O que aconteceu foi que, simplesmente, chegámos a uma altura da nossa vida em que começámos a questionar a existência ou não de um Deus.

Contudo, para se falar de religião é preciso estar-se minimamente atento a ela…
Exacto. Para se falar sobre um determinado assunto devemos estar minimamente informados, principalmente sobre um assunto tão delicado como o da religião.

Acha que, por exemplo, um Papa conservador como Ratzinger compromete ainda mais a imagem e o futuro da Igreja? Era mais do vosso agrado uma personalidade como a de João Paulo II?
É verdade que o Papa Bento XVI está envolvido em algumas polémicas mas também não é menos verdade que o Papa João Paulo II também era, em certa parte, conservador. Temas como aborto, separações, pesquisas genéticas, a separação entre o mundo da religião e o mundo “mundano” foram alvo de duras críticas do anterior Papa. Tanto um como o outro têm de seguir um dogma, uma doutrina que por si só é bastante conservadora. Como tal, acaba por ser normal haver atitudes como as demonstradas pelos dois. Acho que é um pouco indiferente se é mais do nosso agrado um ou o outro. Simplesmente, não seguimos esta doutrina, apenas ficamos felizes por estarmos bastante mais evoluídos do que no séc. XII e não corrermos o risco de voltar a ser vítimas da Inquisição.

Outro ponto de que estou certo de que se orgulham é do videoclip de “No Words From The Dead”. Como foi chegar a um produto tão profissional?
O videoclip era algo que estava nos nossos planos, fazia parte de uma campanha de promoção ao nosso álbum. Surgiu a oportunidade de o realizar em conjunto com Débora Castro e graças a um trabalho em conjunto conseguimos atingir aquilo que desejávamos – um videoclip que não devesse nada ao de uma banda profissional. Mais uma vez penso que ficou provado que nos Açores também é possível fazer-se algo que podiam pensar ser impossível fazer.

A curto/médio prazo podemos ter os Anomally em digressão de promoção a “Once In Hell…” fora das ilhas?
Este é um dos nossos objectivos para o ano que se segue. No entanto, temos primeiro de dar a conhecer o nosso trabalho fora das ilhas para depois pensarmos em avançar com algumas datas no continente.

E uma vez no Inferno… Como se sentem? [risos]
[risos] Sentimo-nos bastante bem. Um pouco cansados, é verdade, porque nada disto se consegue sem trabalho, mas é algo que vale a pena. Verdade seja dita, gostava de estar neste “inferno” durante muitos mais anos.

www.anomally.com
www.myspace.com/theanomally

Nuno Costa
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