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Entrevista Ensoph

NA VANGUARDA DA DEMÊNCIA

Erguidos sobre um conceito muito próprio, os italianos Ensoph são uma das bandas actuais que melhor consegue fundir, musical e teatralmente, o metal com a música dark electrónica. A prová-lo está o surpreendente “Opus Dementiae”, álbum de 2004. O guitarrista Giuliano explica a essência dos Ensoph.

Faz-nos um pequeno resumo sobre a história da formação dos Ensoph.
A banda nasceu em 1997 das cinzas de um anterior projecto, os Endaymynion, e é composta por seis elementos: o Giuliano [guitarras e programação], o Zenone [bateria], o Nicholas [voz], o Massimo [baixo], o Leonardo [teclas] e a Anna [flauta]. Até agora lançamos o mini-CD “Les Confessions du Mat” [No-Brain Rec] em 1998, um longa-duração intitulado “Bleeding Womb Of Ananke” [Beyond Prod] em 2001, e duas promos: “Ananke Or The Spyral – Trinity Beyond Alpha And Omega” em 2000, e “Sophia” em 2002. “Opus Dementiae” é o título do nosso último álbum que está disponível através da italiana Cruz Del Sur Music, com distribuição em Portugal pela Nemesis.

O modo de expressão dos Ensoph é bastante intrínseco e baseado em conceitos como o esoterismo, o teatro e a filosofia. Fala-nos dessa forma de se exprimirem.
Quando o Zenone e eu começamos a elaborar o conceito relativo ao projecto “Ensoph” tentámos atingir apenas um objectivo: a completa desconstrução de todos os tópicos comuns da tradição esotérico-filosófica e tentámos eliminar o sentido comum da palavra “sentido” e atingir o cruzamento entre passado, futuro e a ausência de tempo.

Vocês uma vez levaram o seu lado teatral para o palco e colaboraram com uma companhia de teatro, certo? Como foi que funcionou?
Desde as nossas origens que colaboramos com uma companhia de teatro chamada Noir, ligada a Oniric e temas absurdos [como Ionesco ou Arteaud], a qual levou-nos e executar alguns espectáculos bizarros. Estes espectáculos são muito difíceis de descrever, até para mim. Acredita, é preciso vê-los! De qualquer maneira, agora abraçamos uma atitude mais minimalista. Não colaboramos mais com a Noir. Todo o nosso aspecto visual está agora concentrado nos actos “esquizofrénicos” do nosso vocalista Nicholas.

Vocês usam também um vocabulário muito próprio bem como alguns termos em latim nas vossas letras. Queres explicar o seu significado aos nossos leitores? Por exemplo, o que é “Jaldaboath” ou quem é “Shopia”?
As letras são a base do nosso trabalho, a banda não poderia existir sem a sua mensagem que é a razão da sua existência. Elas são a expressão dos meus interesses dentro do campo do esoterismo, filosofia e literatura. Eu normalmente costumo fundir tudo o que é simbolismo vindo das tradições que entendo serem importantes para explicar o que eu quero dizer em novas formas e contextos, tudo para explorar novos significados e linguagens. As nossas letras são como que poemas não ortodoxos que se servem de imagens tradicionais e religiosas para encontrar novas formas de expressão. É uma das nossas imagens de marca e é um tipo de linguagem que vamos usar sempre. Nós usamos diferentes línguas porque usamos sons diferentes para expressar diferentes conceitos. Por exemplo, o italiano tem um som heavy único que usamos para afirmações curtas e fortes, ou para fazer os tons do Nicholas ficarem agudos. Jaldaboath é o extremo, e por conseguinte, o chefe governador, e para além disso o Demiurgo por excelência. Sim, Jaldaboath, o presunçoso Demiurgo... Sophia é um dos iões de Deus. A ciência perfeita é o alvo de todos os iões. Eles emanaram de Deus, eles ansiaram por Ele, eles foram devorados pelo insaciável desejo de o conhecer.

Falar da vossa música é definitivamente uma tarefa difícil. Para mim vocês soam como uma banda multi-étnica. Queres dar-nos a tua opinião pessoal?
“Gloomy Avant-gardism For A De-Generation Wasted” é uma boa definição para a nossa música. Nós tocamos num mundo e para um mundo que tem desperdiçado montes de oportunidades, para aquele que anulou até os últimos vestígios de bom senso preferindo em vez disso viver neste limbo de irresponsabilidade... Nós somos parte desta geração “perdida” e nós tocamos para ela num mundo “perdido”. É apenas uma questão de factos. Nós encontramos traços antigos de uma razão perdida num mundo sem significado e construímos catedrais à procura de algo que está perdido, umas vezes mostrando um caminho, outras vezes descrevendo um mundo que ninguém percebe... Nós apenas tocamos aquilo que achamos certo para tocarmos e nós não queremos impressionar ninguém com algo nunca ouvido antes. Nós não temos barreiras musicais e é este o nosso propósito. Se alguém encara a nossa música como um desafio, então é bom extrair reacções do público. Já agora, quando nós começámos a tocar esse tipo de música já sabíamos o que iríamos encontrar, por isso, não é um problema. O público do novo milénio é suficientemente maduro para receber algo que quebra todos os padrões comuns. Se tocas algo em que realmente acreditas então as pessoas vão compreender isso e vão te apoiar.

Como é que vocês trabalham para chegar a um som tão ecléctico e rico?
Geralmente, começamos com alguns riffs de guitarra propostos por mim. Tentamos pensar numa boa estrutura para a música e depois adicionamos a base electrónica. Os últimos passos são os arranjos, a flauta, os teclados e as letras. Como podes constatar não é nada muito diferente de compor uma canção comum baseada em guitarra, baixo e bateria. O elemento que faz a diferença da nossa música em relação aos propósitos mais comuns não está no número de instrumentos que usamos, mas sim na vontade de deitar abaixo todas as barreiras comuns da música e deixar a criatividade falar por si própria sem limitações. Nós somos seis individualidades completamente diferentes. Nós temos raízes musicais diferentes e ouvimos coisas diferentes. O metal extremo é o campo comum onde as nossas experiências se juntam e falam para criar algo. Nós não tentamos por tudo o que queremos numa só música só para impressionar alguém com algo nunca ouvido, mas simplesmente não nos fechamos a nossa criatividade numa “jaula” quando estamos a compor. Trata-se de algo completamente diferente.

Também a vossa imagem é bem avantgard, obscura e excêntrica...
A imagem é importante como uma ferramenta útil para introduzir a atmosfera que desejas invocar com a tua música. O alvo principal é sempre um bom propósito artístico, mas até a forma como te apresentas faz parte de um “pacote” profissional. A imagem da banda é muito importante para nós porque é a primeira impressão que as pessoas têm de ti. É uma parte do nosso propósito e um retracto perfeito para o nosso estilo musical que é uma ligação entre passado e futuro e, como já deves ter visto, a nossa imagem invoca uma dimensão obscura intemporal, e nós tratamos obsessivamente de tudo o que envolve a banda.

Vocês trabalharam com o Bruno Kramm [Kramm/Das Ich] na gravação de um remix de “Shopia’s Fall” para a vossa demo de 2002. Vocês são fãs dele?
A banda é composta por fãs dos Das Ich, por isso, quando começámos a pensar na possibilidade de fazer um remix pensámos logo que o Bruno Kramm seria a pessoa certa para isso. Ele mostrou-se logo muito entusiasta com a ideia da colaboração. Nós mandámos-lhe algumas amostras de “Sophia’s Fall” e ele manipulou todo o material de uma forma verdadeiramente extraordinária. Nós pensamos que esse tipo de colaboração é uma boa maneira de explorar novos pontos de vista e ângulos da nossa música que de nenhuma outra forma poderiam ser expressas. Por isso, pensamos que outras colaborações poderão ser possíveis no futuro com outros nomes famosos. Nós achamos que a electrónica é um bom instrumento para alargar o raio de criatividade de cada um. Certamente isso não poderá fazer de ninguém um artista mas pode ajudar a melhorar os teus horizontes acerca da fórmula padrão do rock. Enquanto esta se mantiver como um instrumento e não no objectivo principal poderá ser uma boa coisa.

Entretanto, vocês perderam dois dos vossos elementos originais. O que aconteceu?
Nós não queremos falar mais sobre eles... Simplesmente perdemos os nossos sentimentos por eles. Eles quebraram o equilíbrio e por isso deixámo-los para trás como uma evolução natural das coisas.

Agora que “Opus Dementiae” está disponível em todo o mundo, como se sentem em relação a ele?
Nós estamos muito satisfeitos com o resultado final. A Cruz Del Sur está a fazer um grande trabalho de promoção e todos os ecos até agora têm sido entusiastas, especialmente nos Estados Unidos, France, Bélgica e Alemanha. Eu penso que os nossos propósitos forma compreendidos bastante bem e os nossos objectivos com esse álbum, em relação aos críticos e público, foram atingidos. A imprensa profissional escreveu bastante bem em relação ao álbum mesmo que algumas zines mais conservadores se tenham questionado quanto a pôr-nos sob a bandeira do “true metal”. Já agora, existe um grande interesse em redor da banda (mais do que aquilo que esperávamos) e nós recebemos todos os dias sinais surpreendentes de apoio por parte da editora, parceiros e ouvintes menos convencionais por esse mundo fora. Esperamos também que as vendas sejam boas, principalmente pela nossa editora, que merece pelo trabalho que tem feito por nós.

Para o futuro já existem alguns planos especiais?
Para os primeiros meses do ano que vem está planeado um álbum experimental exclusivamente no plano electrónico/experimental, com montes de colaborações importantes de bandas como os Momentum, Ain Soph, Foresta Di Ferro e muitas mais bandas de culto da cena esotérica, sempre dentro da Cruz Del Sur Music. Mas ainda é um bocado cedo para falar nisso.

Nuno Costa
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