Entrevista Minsk
MOVIMENTOS CÓSMICOS
Era bastante improvável que uma remota cidade bielorrussa, com um passado histórico martirizante, inspirasse uma banda de post-rock psicadélico do estado de Illinois. Pois bem, se pensarmos no som colapsante, denso e rejuvenescedor dos Minsk é fácil estabelecer associações. Ao terceiro disco de originais, “With Echoes In The Movement Of Stone”, este quarteto atinge um patamar artístico que lhe permite dar o justo salto para a lista do que de melhor este género musical concebe actualmente. Uma mística e envolvente entidade que abordámos na pessoa do guitarrista Chris Bennett.
Admito que caminhei assustado pela minha casa à noite depois de ouvir a vossa discografia! O vosso som é verdadeiramente profundo, introspectivo e em alguns momentos perturbante. Devo deixar de ouvir-vos? [risos]
Bom, essa decisão cabe inteiramente ao ouvinte. A nossa esperança é a de que com cada audição se estabeleçam novas perspectivas. Os nossos temas são meros reflexos do que significa existir enquanto humanos, do modo e no espaço em que o fazemos. São perspectivas únicas relacionadas com nós os quatro.
Pergunto-me várias vezes: como é que o vosso tipo de bandas funciona em termos de estado de espírito para conseguir escrever música tão… densa?
Penso que depende da pessoa que a está a criar e do dia em que surgem as ideias. As músicas são, simultaneamente, uma celebração de vida e um requiem para o tempo perdido e os idealismos destruídos. Os métodos usados para gerar um estado de espírito podem variar diariamente. Eles podem implicar caminhar na floresta ou numa cidade barulhenta, meditação, interacção social, uso de substâncias psicoactivas e podem funcionar, simplesmente, como uma maneira de esquecer um dia de trabalho.
Achei interessante a associação do vosso nome à cidade bielorrussa com o mesmo nome. Esta foi vítima de várias atrocidades ao longo dos séculos…
Achámos a história de Minsk inspiradora, nomeadamente a sua habilidade para crescer depois de ter sido completamente queimada. O simbolismo da Fénix renascida das cinzas pode ser perfeitamente aplicada a várias áreas das nossas vidas. O nome dessa cidade parece evocar um sentimento de desconhecido e mistério que esperamos traduzir para o som que criamos.
Estiveram lá alguma vez?
Não. Sondámos as possibilidades de actuar em Minsk, mas acabámos por perceber que seria algo complicado atendendo ao clima político que se vive lá actualmente. Porém, confesso que seria fantástico tocar as nossas músicas naquele sítio.
Fale-nos do processo de escrita de “With Echoes…”. Penso que este regresso é mais agressivo e menos ambiental que os seus antecessores…
Concordo que seja mais agressivo. Penso que reflecte o ambiente nas nossas vidas enquanto o escrevemos. Todavia, nunca se tratou de algo consciente. Simplesmente, formou-se dessa maneira, mas representa, inegavelmente, a nossa identidade. Em última instância, podemos tomar isto como um sinal de que crescemos como indivíduos e estamos a aplicar as nossas experiências no “ruído” que criamos.
Para além das experiências pessoais, é também recorrente basearem-se em literatura, acontecimentos históricos ou aspectos psicológicos?
Absorvemos inspiração de todas as coisas que mencionou. Alguns de nós são leitores ávidos e estudantes de História. Thoreau, Foucault, Dostoevsky, Emerson, McCarthy, Faulkner, Zinn, Kerouac; Hawthorne, Poe, Lovecraft e Gibran são apenas alguns dos autores cujas obras ajudou a moldar-nos como indivíduos. O nome da nossa banda surgiu do interesse na história da Europa de Leste.
Digamos então que são todos rapazes normais. As pessoas que pensam que precisam de psiquiatras estão completamente enganadas!
Nós precisamos de toda a ajuda. Nem todos nós conseguimos pagar um psiquiatra… por isso, criámos uma banda! [risos]
Embora o vosso som seja complicado de digerir, penso que a sua popularidade cresceu consideravelmente nos últimos anos. Imagina-o a tornar-se, ainda que relativamente, numa tendência?
Penso que tem havido uma série de bandas a tentar adicionar elementos psicadélicos à música pesada. Isso acaba por revelar-se em vários subgéneros. Acho que a imprensa tenta aglomerá-los num só… mas não prestamos muita atenção a esse assunto. Diria apenas que é muito bom haver mais bandas a explorar novas texturas na música.
Qual pode ser o maior desafio para escrever este tipo de música? Para além do sentimento, haverá também a cuidar aspectos técnicos…
Às vezes o mais difícil é saber quando uma música está concluída e tem todos os elementos precisos, sem exagerarmos nas texturas. Penso que tem que haver espaço para a música respirar. Espero que isso seja algo que estejamos a aprender a reconhecer. Uma “parede de som” é maravilhosa mas se se mantém constante pode perder a sua eficácia. Tentamos não sacrificar a alma dos temas em detrimento da técnica. Cada tema expõe-nos novos desafios.
Desta vez criaram temas mais curtos…
Penso que fomos mais directos na composição deste álbum, mas não estabelecemos limites à duração das músicas. Estas apenas surgiram mais concisas.
Onde é que se juntam para compor? Também usam aquelas salas de ensaio no meio do nada?
Escrevemos na nossa sala de ensaios e também em nossas casas, individualmente. Vamos ensaiar com algumas ideias soltas e depois começámos a percepcioná-las como banda. A minha casa, onde ensaiamos, é perto de uma floresta, portanto, é mais calma. Achei que era um bom ambiente para compor. Por vezes, usamos também algumas substâncias naturais como ferramenta benéfica para o nosso processo criativo… mas ia adorar ter uma casa no “meio do nada”. Talvez no futuro.
A pergunta pode parecer absurda, mas atendendo a que a vossa sonoridade me faz pensar em espaço e cosmos… o que acha do empreendimento do LHC, o maior acelerador de partículas do mundo, construído na Suíça? É um sinal da voracidade humana para saber tudo sobre a vida e o que a originou, sabendo que pode até correr riscos?
Bom, é difícil responder a essa pergunta sem ser hipócrita. Estou aqui sentado a responder-te a uma entrevista, mas mesmo assim sinto-me a romantizar uma maneira mais simples de viver. Todos os dias ficamos com a ideia de que as nossas vidas são mais “fáceis” do que as dos nossos pais e avós. Serão mesmo? Não tenho a certeza… As pessoas de hoje estão mais evoluídas, mas será que no sentido de fazer evoluir a espécie? Talvez estejamos a caminhar no sentido da extinção através da vontade de descobrir e conquistar o universo. O LHC é um verdadeiro testamento da ingenuidade humana, mas não consigo dizer como ele é capaz de melhorar o nosso modo de vida. Ouvi falar da preocupação de haver uma avaria que gerasse matéria negra. Penso que uma forma agrária de existência preenche a necessidade do ser humano ter contacto directo com o planeta de que depende. Se este contacto for perdido, a humanidade sofrerá e vai experienciar impensáveis tormentos.
Outro aspecto atónito neste assunto é o financeiro. Vejo um enorme paradoxo ao olhar para a quantidade astronómica de dinheiro investido neste projecto enquanto milhões de pessoas vivem com menos de um dólar por dia. O ser humano não deveria primeiro resolver problemas base da sua existência e aceitar certas coisas como elas são?
É completamente estúpido que alguém na Terra esteja sem comida. Eu vivo perto algumas das quintas mais férteis dos Estados Unidos. São usadas para cultivar milho, mas isso não garante nutrição suficiente. As grandes corporações é que conseguem tirar avultados lucros dos produtos feitos à base de milho. Porque não aproveitam estes terrenos para cultivar frutos, vegetais e grão? Devia ser mais importante garantir alimento de qualidade do que gastar milhões de dólares num super acelerador de partículas.
Terminam a vossa digressão nos Estados Unidos este mês. Como está a correr?
Acabámos há pouco tempo uma digressão na parte ocidental do país com os Wolves In The Throne Room. É a nossa zona preferida. Foi muito divertido.
Depois disso fazem uma pausa e viajam para a Europa em Outubro, permanecendo até Novembro. Que impressões têm do público do “velho continente”?
Fizemos a nossa primeira digressão europeia em Maio deste ano. Estamos muito entusiasmados por regressar tão cedo. Ficámos maravilhados pelo facto de toda a gente na Europa ser incrivelmente receptiva e hospitaleira. É diferente de estar em digressão nos Estados Unidos… pelo melhor. Preferimos. Parece que as pessoas apreciam mais as artes. Esperamos que a nossa segunda digressão europeia seja ainda melhor do que a primeira. Sentimo-nos sortudos por conhecer pessoas brilhantes do outro lado do oceano.
De resto, quais podem ser as maiores ambições de uma banda como os Minsk?
Acima de tudo, criar sons com significado e ter o prazer de partilhá-los com espíritos da mesma natureza; estarmos ainda aptos a transferir para a nossa música os nossos pensamentos e emoções. As vendas de discos não são uma preocupação.
www.thesoundofminsk.com
www.myspace.com/minsk
Nuno Costa
Era bastante improvável que uma remota cidade bielorrussa, com um passado histórico martirizante, inspirasse uma banda de post-rock psicadélico do estado de Illinois. Pois bem, se pensarmos no som colapsante, denso e rejuvenescedor dos Minsk é fácil estabelecer associações. Ao terceiro disco de originais, “With Echoes In The Movement Of Stone”, este quarteto atinge um patamar artístico que lhe permite dar o justo salto para a lista do que de melhor este género musical concebe actualmente. Uma mística e envolvente entidade que abordámos na pessoa do guitarrista Chris Bennett.
Admito que caminhei assustado pela minha casa à noite depois de ouvir a vossa discografia! O vosso som é verdadeiramente profundo, introspectivo e em alguns momentos perturbante. Devo deixar de ouvir-vos? [risos]
Bom, essa decisão cabe inteiramente ao ouvinte. A nossa esperança é a de que com cada audição se estabeleçam novas perspectivas. Os nossos temas são meros reflexos do que significa existir enquanto humanos, do modo e no espaço em que o fazemos. São perspectivas únicas relacionadas com nós os quatro.
Pergunto-me várias vezes: como é que o vosso tipo de bandas funciona em termos de estado de espírito para conseguir escrever música tão… densa?
Penso que depende da pessoa que a está a criar e do dia em que surgem as ideias. As músicas são, simultaneamente, uma celebração de vida e um requiem para o tempo perdido e os idealismos destruídos. Os métodos usados para gerar um estado de espírito podem variar diariamente. Eles podem implicar caminhar na floresta ou numa cidade barulhenta, meditação, interacção social, uso de substâncias psicoactivas e podem funcionar, simplesmente, como uma maneira de esquecer um dia de trabalho.
Achei interessante a associação do vosso nome à cidade bielorrussa com o mesmo nome. Esta foi vítima de várias atrocidades ao longo dos séculos…
Achámos a história de Minsk inspiradora, nomeadamente a sua habilidade para crescer depois de ter sido completamente queimada. O simbolismo da Fénix renascida das cinzas pode ser perfeitamente aplicada a várias áreas das nossas vidas. O nome dessa cidade parece evocar um sentimento de desconhecido e mistério que esperamos traduzir para o som que criamos.
Estiveram lá alguma vez?
Não. Sondámos as possibilidades de actuar em Minsk, mas acabámos por perceber que seria algo complicado atendendo ao clima político que se vive lá actualmente. Porém, confesso que seria fantástico tocar as nossas músicas naquele sítio.
Fale-nos do processo de escrita de “With Echoes…”. Penso que este regresso é mais agressivo e menos ambiental que os seus antecessores…
Concordo que seja mais agressivo. Penso que reflecte o ambiente nas nossas vidas enquanto o escrevemos. Todavia, nunca se tratou de algo consciente. Simplesmente, formou-se dessa maneira, mas representa, inegavelmente, a nossa identidade. Em última instância, podemos tomar isto como um sinal de que crescemos como indivíduos e estamos a aplicar as nossas experiências no “ruído” que criamos.
Para além das experiências pessoais, é também recorrente basearem-se em literatura, acontecimentos históricos ou aspectos psicológicos?
Absorvemos inspiração de todas as coisas que mencionou. Alguns de nós são leitores ávidos e estudantes de História. Thoreau, Foucault, Dostoevsky, Emerson, McCarthy, Faulkner, Zinn, Kerouac; Hawthorne, Poe, Lovecraft e Gibran são apenas alguns dos autores cujas obras ajudou a moldar-nos como indivíduos. O nome da nossa banda surgiu do interesse na história da Europa de Leste.
Digamos então que são todos rapazes normais. As pessoas que pensam que precisam de psiquiatras estão completamente enganadas!
Nós precisamos de toda a ajuda. Nem todos nós conseguimos pagar um psiquiatra… por isso, criámos uma banda! [risos]
Embora o vosso som seja complicado de digerir, penso que a sua popularidade cresceu consideravelmente nos últimos anos. Imagina-o a tornar-se, ainda que relativamente, numa tendência?
Penso que tem havido uma série de bandas a tentar adicionar elementos psicadélicos à música pesada. Isso acaba por revelar-se em vários subgéneros. Acho que a imprensa tenta aglomerá-los num só… mas não prestamos muita atenção a esse assunto. Diria apenas que é muito bom haver mais bandas a explorar novas texturas na música.
Qual pode ser o maior desafio para escrever este tipo de música? Para além do sentimento, haverá também a cuidar aspectos técnicos…
Às vezes o mais difícil é saber quando uma música está concluída e tem todos os elementos precisos, sem exagerarmos nas texturas. Penso que tem que haver espaço para a música respirar. Espero que isso seja algo que estejamos a aprender a reconhecer. Uma “parede de som” é maravilhosa mas se se mantém constante pode perder a sua eficácia. Tentamos não sacrificar a alma dos temas em detrimento da técnica. Cada tema expõe-nos novos desafios.
Desta vez criaram temas mais curtos…
Penso que fomos mais directos na composição deste álbum, mas não estabelecemos limites à duração das músicas. Estas apenas surgiram mais concisas.
Onde é que se juntam para compor? Também usam aquelas salas de ensaio no meio do nada?
Escrevemos na nossa sala de ensaios e também em nossas casas, individualmente. Vamos ensaiar com algumas ideias soltas e depois começámos a percepcioná-las como banda. A minha casa, onde ensaiamos, é perto de uma floresta, portanto, é mais calma. Achei que era um bom ambiente para compor. Por vezes, usamos também algumas substâncias naturais como ferramenta benéfica para o nosso processo criativo… mas ia adorar ter uma casa no “meio do nada”. Talvez no futuro.
A pergunta pode parecer absurda, mas atendendo a que a vossa sonoridade me faz pensar em espaço e cosmos… o que acha do empreendimento do LHC, o maior acelerador de partículas do mundo, construído na Suíça? É um sinal da voracidade humana para saber tudo sobre a vida e o que a originou, sabendo que pode até correr riscos?
Bom, é difícil responder a essa pergunta sem ser hipócrita. Estou aqui sentado a responder-te a uma entrevista, mas mesmo assim sinto-me a romantizar uma maneira mais simples de viver. Todos os dias ficamos com a ideia de que as nossas vidas são mais “fáceis” do que as dos nossos pais e avós. Serão mesmo? Não tenho a certeza… As pessoas de hoje estão mais evoluídas, mas será que no sentido de fazer evoluir a espécie? Talvez estejamos a caminhar no sentido da extinção através da vontade de descobrir e conquistar o universo. O LHC é um verdadeiro testamento da ingenuidade humana, mas não consigo dizer como ele é capaz de melhorar o nosso modo de vida. Ouvi falar da preocupação de haver uma avaria que gerasse matéria negra. Penso que uma forma agrária de existência preenche a necessidade do ser humano ter contacto directo com o planeta de que depende. Se este contacto for perdido, a humanidade sofrerá e vai experienciar impensáveis tormentos.
Outro aspecto atónito neste assunto é o financeiro. Vejo um enorme paradoxo ao olhar para a quantidade astronómica de dinheiro investido neste projecto enquanto milhões de pessoas vivem com menos de um dólar por dia. O ser humano não deveria primeiro resolver problemas base da sua existência e aceitar certas coisas como elas são?
É completamente estúpido que alguém na Terra esteja sem comida. Eu vivo perto algumas das quintas mais férteis dos Estados Unidos. São usadas para cultivar milho, mas isso não garante nutrição suficiente. As grandes corporações é que conseguem tirar avultados lucros dos produtos feitos à base de milho. Porque não aproveitam estes terrenos para cultivar frutos, vegetais e grão? Devia ser mais importante garantir alimento de qualidade do que gastar milhões de dólares num super acelerador de partículas.
Terminam a vossa digressão nos Estados Unidos este mês. Como está a correr?
Acabámos há pouco tempo uma digressão na parte ocidental do país com os Wolves In The Throne Room. É a nossa zona preferida. Foi muito divertido.
Depois disso fazem uma pausa e viajam para a Europa em Outubro, permanecendo até Novembro. Que impressões têm do público do “velho continente”?
Fizemos a nossa primeira digressão europeia em Maio deste ano. Estamos muito entusiasmados por regressar tão cedo. Ficámos maravilhados pelo facto de toda a gente na Europa ser incrivelmente receptiva e hospitaleira. É diferente de estar em digressão nos Estados Unidos… pelo melhor. Preferimos. Parece que as pessoas apreciam mais as artes. Esperamos que a nossa segunda digressão europeia seja ainda melhor do que a primeira. Sentimo-nos sortudos por conhecer pessoas brilhantes do outro lado do oceano.
De resto, quais podem ser as maiores ambições de uma banda como os Minsk?
Acima de tudo, criar sons com significado e ter o prazer de partilhá-los com espíritos da mesma natureza; estarmos ainda aptos a transferir para a nossa música os nossos pensamentos e emoções. As vendas de discos não são uma preocupação.
www.thesoundofminsk.com
www.myspace.com/minsk
Nuno Costa