Lotação esgotada
É este o sentimento que povoa a mente dos mais atentos e
preocupados com o mundo da música. Principalmente aquele mais "raso",
mais underground. É aí que está a gema que compõe as estrelas mais respeitadas
hoje em dia.
Também não é nenhuma novidade que a proliferação da música
enquanto negócio e, sobretudo, o desenvolvimento das tecnologias, fez com que
se tornasse uma mera banalidade ter um instrumento, aprender uns acordes, criar
uma banda e, por fim, lançar um disco. Ou deva-se dizer: um monte de ficheiros?
As vozes dividem-se e fazem-se ouvir bem alto. Aquelas que
gostam muito de debater quem é que é mais honesto, mais sério consigo e com a
arte em questão - se os mais velhos ou os mais putos. Isso é o que menos
interessa aqui, não fosse a triste consciência de que a abundância e também a
preocupante futilidade em que tudo isto se tornou não fosse um autêntico
embuste para muitos sonhadores, bem ou mal iludidos. Artistas também, que
afinal sempre se encontram no meio de enorme cosmos.
Este é apenas um manifesto apreensivo e consternado de quem
(e não é preciso fazer parte do círculo) se apercebe de que já não há lugar
para todos. O que não é de agora.
E será que a música só reserva espaço para os verdadeiros
inovadores? Tem-se a clara sensação de que a música estagnou de alguma forma, há
bastante tempo, não obstante a qualidade rígida dos trabalhos, paradoxalmente
numa altura em que os meios ao dispor são os melhores. Os intérpretes,
porventura, também são melhores do que nunca - provavelmente até melhores do
que muitos génios intemporais que nem devemos mencionar para não ferir susceptibilidades.
E o que se pode inferir de tudo isto? É que se já não há
lugar para todos talvez que haja a consciência ou quem faça abrir os olhos de quem
a acha que tem. Sim, porque a música, tal como qualquer actividade, deve ser
para quem pode e não para quem quer - por mais que custe "roubar" o
sonho a alguém. Mas seria isso justo? Chegarmo-nos para o lado, deixar os
outros passar e assim voltar costas à liberdade de expressar sentimentos
através das mais variadas artes?
Cavando bem fundo a questão, parece claro que o factor
"negócio" em tudo isso minou determinantemente o sentido puro da
música. Sempre se fez fortunas com ela, mas nos tempos de Mozart, Beethoven ou
mesmo Jimi Hendrix ainda não havia tal obsessão. Não havia tanto mediatismo ou
quase nenhum, o que derrubava a ideia de que para além da arte, a música também
era uma forma fácil e engraçada de se ser popular e fazer uns trocos... mais do
que transmitir ideias e sentimentos.
A globalização tornou tudo num fenómeno para todos os olhos comerem
e, qual pecado da carne, todos querem ser comidos. E como todos sabemos, uma
refeição feita à pressa e sem os devidos temperos, acaba por resultar... numa
valente indigestão.
Nuno Costa