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Entrevista - José Rocha [Mangualde Hardmetalfest]

O UNDERGROUND NO SANGUE
"O segredo? Muita perseverança, força de vontade e nunca ter desistido mesmo em situações adversas"

Goza de estatuto de culto apesar da discrição mediática. No puro sentido do underground, o Mangualde Hardmetalfest continua a constituir um importante municiador do metal nacional e com capacidade suficiente para apresentar grandes nomes internacionais. Fundado em 1997, é o festival com mais edições em Portugal, apresentando o seu 19º cartaz já no próximo dia 12 de Janeiro na cidade de Mangualde, distrito de Viseu. José Rocha é o responsável pela iniciativa que traz este ano os lendários norte-americanos Master e os thrashers teutónicos Contradiction, entre vários outros nomes de peso, para um ambiente que se torna cada vez mais distinto e apetecível.

A pergunta que se impõe neste momento: sente-se cansado após tantos anos de underground nacional?
Cansado não diria, mas claro que desgastado em parte… já deixei de fazer parte de uma banda por esse motivo. Contudo, por enquanto ainda sinto forças para continuar com o festival dado que tenho uma empresa individual de eventos e espectáculos que serve mesmo para isso.

Recupere-nos os primórdios da sua ligação ao metal. Há programas de rádio, bandas e vários festivais para além do Mangualde. Como surge esta vontade de ter um papel activo na "cena" em vez de ficar apenas no sofá a ouvir metal?
Sim, realmente tudo começou com o meu programa de rádio onde apoiava 100% o que se fazia mais no underground e que me fascinava. Depois havia o querer ver essas bandas ao vivo e trabalhar com elas, e partilhava também o sonho de ter uma banda como aquelas que ouvia no sofá. Moral da história: já me estava no sangue!

Muitos se questionarão: é promotor a tempo inteiro ou... o metal definitivamente não dá dinheiro em Portugal?
Claro que não! [risos] Eu tenho um emprego normalíssimo como quase toda gente e faço o resto como hobby. Como devem saber, há muitíssimo poucos a sobreviver só com uma banda. Não temos mercado para mais.

Como se chega ao título de festival com mais edições em Portugal? Quais os principais desafios e dificuldades?
Muita perseverança, força de vontade, trabalho e nunca ter desistido mesmo em situações adversas. Os principais desafios são continuar a fazer o festival com a melhor qualidade possível, crescer aos poucos, continuar a aprender e tentar fazer dois dias no futuro. As dificuldades estão no facto de Mangualde se situar longe de grandes cidades como Lisboa, Porto ou Braga, onde facilmente poderíamos ter sempre centenas de pessoas sem terem grandes despesas de deslocação. Além disso, a situação financeira, falta de mais tempo e as condições climatéricas pouco favoráveis nesta época podem ser sempre as maiores dificuldades.

De que forma concreta a crise económica tem afectado a organização do festival?
Em contraciclo com a crise, reuniu-se o maior número de patrocinadores possível mas mesmo assim precisamos do apoio do headbanger no dia do festival, embora tenha consciência de que as dificuldades económicas estão aí para toda gente.

Qual o orçamento médio para a realização do Mangualde?
Ao longo do festival sempre houve boa colaboração da Câmara local e de alguns patrocínios importantes na divulgação como a Rádio Cidade Viriato que espalha o spot por três meses todos os dias. O orçamento são ainda alguns milhares de euros, pois há sempre despesas que não estamos a contar. Por isso, contas só no final. 

Muitos talvez já não se recordarão, mas os Behemoth passaram por Mangualde em 2001. Certamente não sonhava na altura que a banda ganhasse a dimensão que tem hoje. Quer recordar-nos aqueles tempos ou até mesmo todo o processo que levou à contratação da banda?
Sim, nesse festival eram para ter vindo também os Ancient Rites. Na altura, eu tinha um contacto com a Division House que normalmente era a agência que trazia várias bandas estrangeiras a Portugal e dada a boa relação entre ambos foi fácil. Nunca pensei que a banda se tornasse tão grande mas já paguei bem mais por bandas nacionais e estrangeiras de menor valia! [risos]

Que banda(s) ainda sonha trazer ao Mangualde?
Ui, adorava ter os Anthrax,  por exemplo, mas para já estão completamente fora de questão! [risos]

É mais fácil lidar com as bandas nacionais ou com as estrangeiras quando se trata de negociar?
Claro que, por todos os aspectos óbvios, as nossas são mais fáceis, mas também digo que nem sempre isso acontece.

Há algum episódio insólito ou mais infeliz a relatar no percurso do festival?
Hum... normalmente o festival tem óptimo ambiente e não tem havido grande stress. Episódio insólito talvez o dos Impaled Nazarene que queriam entrar no caminho da violência com um punk porque este os insultara... e tantos outros episódios que já nem me recordo bem.

E já agora, qual o que destacaria pela positiva?
Também foram tantos que… destaco os últimos festivais pelo excelente espírito, e o facto de nos considerarmos praticamente pioneiros em conseguir juntar cartazes com metal extremo e punk/hardcore e resultar disso um grande espirito e união.

Para esta 19ª edição, que argumentos aponta para que toda a horda metaleira nacional não falte no próximo dia 12 de Janeiro? 
Quem nunca foi, tem que ir… quem já foi que continue a ir, pois já sabe do que se trata. Bandas de qualidade, ambiente único, cerveja e comida baratas e seguranças educados! [risos] Um festival que de certo agradará a “gregos e troianos” pela variedade e pelo preço único.

Quase forçosamente segue o underground nacional. Está satisfeito com a postura e/ou qualidade dos músicos e bandas ou mesmo com as infraestruturas que lhes são fornecidas?
Temos bandas em Portugal com muita qualidade mas ainda falta algo a nível de apoios às mesmas. Por exemplo, há poucos espaços com condições aceitáveis para receber bandas ao vivo e grande parte das bandas não tem apoios de nenhuma instituição que lhes permitissem ensaiar gratuitamente, etc.

José Rocha com ex-banda, Angriff
Sente alguma espécie de mágoa por o Mangualde não ter crescido como um Barroselas ou mesmo Vagos? Ou nem será essa a intenção/preocupação?
Claro que não, Mangualde é Mangualde e tem sempre as dificuldades cativas que enumerei em relação a esses festivais que beneficiam de uma localização geográfica com outras condições. Além disso, assumo erros do passado a nível de organização, timing e planeamento que fez com que o festival tivesse perdido um pouco o "comboio" a meio do trajecto. Porém, penso que agora estamos no caminho certo e com calma faremos o HMF crescer, sem querer comparar com os outros por maior respeito que tenha por esses eventos.

Tem planos para outros eventos neste momento?
Para já não, mas se surgirem boas oportunidades….

Nuno Costa




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