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Entrevista Dementia 13

ALGUÉM FALOU EM TRADIÇÃO?
"O Kam Lee [ex-Death] disse-nos que há muito não ouvia algo assim"


Quase vinte anos de carreira a tocar thrash metal nos Pitch Black não foram suficientes. A alma de Álvaro Fernandes é demasiado voraz e aventureira. Para além disso, demasiado fiel às origens. Por esses e outros motivos, não conseguiu mais conter a sua paixão por bandas como os Death, Benediction, Massacre ou Obituary e em 2010 funda os Dementia 13. Um vincado fetiche por filmes de horror ajuda a adornar este quadro de groove e peso. "Tales For The Carnivorous" é apenas o primeiro registo, mas já faz agitar as águas... dentro e fora de portas.

Voltar aos "tempos de escola" é um processo necessário, sendo que hoje em dia não há muitos motivos para a sociedade estar animada? Será esse um dos motivos para o aparecimento deste projecto?
Foi mais pelo prazer de poder tocar outro género que sempre adorei e nunca tinha materializado as minhas ideias uma vez que sempre estive empenhado a 100% em Pitch Black. Com a banda parada, resolvi avançar a sério com os Dementia 13. Mas são os "tempos de escola" sim, ainda por cima nesta banda onde prestamos, precisamente, tributo às bandas que definiram o death metal na sua forma mais pura. Durante anos senti que havia uma lacuna enorme no género. Nem as próprias bandas (ainda activas) que definiram o estilo há vinte anos atrás fazem, actualmente, algo semelhante às suas raízes. O death metal evoluiu em diferentes sentidos ao longo dos anos e parecia que toda a gente já se tinha esquecido como era.

Como referiu, o hiato que se vive nos Pitch Black motivou que avançasse com uma ideia que já tinha. Depois de tantas remodelações, precisava, acima de tudo, de se distanciar um pouco dos Pitch Black?
Sim, precisava, mas não pela banda em si. Apenas porque sempre quis experimentar outros rumos e tocar com outros músicos. Apenas isso. Com o passar do tempo vamos ficando mais velhos e percebemos que temos de aproveitar o tempo ao máximo! Com os Dementia 13 tenho a possibilidade de tocar com músicos com quem nunca tinha tocado e a experiência de cada um deles foi uma mais-valia para o crescimento do projecto. Basicamente, já não sou assim tão novo e com certeza que nunca poderia fazer isto com 60 anos por isso tinha de meter mãos à obra.

Preocupa-o o facto de os Pitch Black ainda não terem encontrado um baterista ao fim de dois anos? Sente receio que a banda desta vez não sobreviva?
Sim, preocupa-me. Mas não me admira. Estamos em Portugal e se já somos poucos, então músicos de metal nem se fala. Depois há outro problema: não chega saber tocar metal, é preciso uma grande força de vontade, profissionalismo e espírito de sacrifício. Muita gente não tem a mínima noção disso e o resultado (muitas vezes) acaba sempre por ser o mesmo... desistem e pronto! Quanto aos Pitch Black, enquanto eu lá estiver vai sobreviver sim. Tenho sempre a necessidade de compor e o thrash continua a ser o meu género preferido. Por isso, com ou sem baterista, vamos continuar a trabalhar.

Falemos então dos Dementia 13. Terá começado tudo no seu "quarto" com os velhinhos clássicos do death metal a rodar na aparelhagem. Quando começa a compor e a acreditar que o seu material tem pernas para andar?
Bom, os clássicos sempre rodaram na minha aparelhagem. No entanto, antes de começar o processo de composição, andei semanas a ouvir única e exclusivamente death metal. Isto porque ajuda-me a interiorizar melhor o feeling quando chega o momento de criar. Como também componho para os Pitch Black e estamos a falar de um género (death metal) que vai buscar a sua sonoridade às raízes do outro (thrash metal) facilmente se misturam ambos e isso era algo que eu não queria. Não queria estar a compor para Dementia 13 e meter riffs mais Thrash ali no meio. Musicalmente não sou muito de meios termos nem de grandes misturas. Por tudo isto inspirei-me nos clássicos do death metal que me acompanharam desde a adolescência para compor para os Dementia 13. Ainda por cima sendo este projecto um tributo assumido ao género tal como se fazia na década de 90. No entanto, a fase de composição só começou mesmo quando decidi materializar as minhas ideias. Antes disso nunca me tinha debruçado a 100% na fase de composição, pois os Pitch Black estavam activos, e misturar as duas coisas podia não ser muito bom. Também não gosto de estar a trabalhar para duas bandas em simultâneo. Com outros músicos isso até pode ser irrelevante mas comigo não funciona assim. Tenho de estar totalmente concentrado naquilo que estou a fazer.

Referem muitas influências, mas será que há uma que o toca particularmente? Consegue eleger a sua banda de death metal favorita?
Claro! É a pergunta mais fácil para mim e a resposta é: Death.

A vertente mais técnica e rápida nunca será um propósito neste projecto?
Vamos ter sempre algumas partes e passagens mais rápidas mas fazer um tema totalmente rápido e técnico não. Blastbeats? Nunca mesmo. Gosto do groove que algumas bandas do género imprimiram na década de 90 e que quase toda a gente deixou de fazer porque a determinada altura começaram a pensar que se tocassem mais rápido significava que tocavam melhor. No entanto, é tão difícil tocar rápido como lento. As nossas influências passam por bandas como Benediction, Unleashed, Morgoth, Massacre, Obituary, Cancer, Death, Resurrection, Bolt Thrower e nenhuma delas toca à velocidade da luz. O resultado prático é fácil de se perceber e para isso basta ver um concerto. Gosto de fazer death metal que tanto dê para abanar a cabeça como para mexer, só não tenho é a necessidade de ir aos dois extremos. Nem demasiado rápido nem demasiado lento! [risos]

Como convence o Marco Silva e o Zé Pedro a entrarem para o "barco"? Diria até mais o Zé Pedro, pois já tem algo bastante extremo com que consumir a sua mente e o seu tempo.
Obriguei-os a aceitar! Estou a brincar! Não foi difícil... falei com o Marco logo no início e ele aceitou prontamente. No caso do Zé Pedro, após ter lançado a notícia deste projecto quando divulgamos que Pitch Black ia parar uns tempos, recebi um e-mail dele a mostrar interesse em participar. De qualquer forma, era a pessoa com quem eu ia falar primeiro e simplesmente ele antecipou-se. Ambos acreditaram em Dementia 13 e acabou por resultar tudo na perfeição, inclusive com os restantes contributos dos outros músicos envolvidos.

Eles tiveram alguma voz na composição ou quando entraram em cena só tiveram que ir para estúdio e gravar?
Nada! Eu sou um ditador e as coisas têm de ser como eu quero! Estou a brincar, como é óbvio. Ainda  alguém vai pensar que tenho o feitio do Dave Mustaine... O Marco sim, contribuiu com algumas ideias pois o processo de gravação e pré-produção foi todo feito em casa dele mas os temas já tinham sido compostos por mim por isso não houve grande coisa que quiséssemos mudar. Para além disso, foi um voto de confiança da parte deles. Estávamos todos satisfeitos com os temas tal como estavam e o trabalho sempre fluiu muito bem. A meio do processo havia sempre algo que mudávamos, cortávamos ou acrescentávamos e o Marco também deu ideias que ficaram na gravação.

Por falar em estúdio, este EP percorreu vários locais até ficar completamente gravado. Esclareça-nos a opção. 
Basicamente, foi tentar fazer tudo e gastar o mínimo possível, simplesmente porque estávamos a começar do zero e não tínhamos dinheiro para investir. Somos todos pobres! Depois havia a questão logística também e a nossa disponibilidade de horários, etc.. Não podíamos simplesmente deslocarmo-nos todos para os UltraSound na Moita e estar lá quatro ou cinco dias a gravar. E por outro lado também fizemos tudo sem pressões nem pressas. Pudemos trabalhar as baterias programadas e gravar as guitarras e baixo em casa. Depois convidei o Xinês dos Switchtense para gravar a bateria nos Ultrasound e o N. Lima gravou as vozes aqui no Porto nos Estúdios 213. Teve de ser assim por todos os motivos já mencionados. E ainda deu imenso trabalho mas penso termos alcançado um bom resultado. Todos estiveram muito bem e o público tem gostado bastante do trabalho. Isso é o que interessa.

Porque recai a escolha no N. Lima e no Xinês para gravarem? 
O Xinês é um dos melhores e mais versáteis bateristas portugueses. Se não o melhor! Devido à proximidade geográfica com o estúdio na Moita também não me deixou qualquer dúvida. Sinceramente nem tinha um plano B. Para mim, seria ideal poder contar com ele neste trabalho, não só por ser um amigo que respeito imenso mas também um profissional naquilo que faz. Felizmente para nós, ele aceitou prontamente! O Lima ouvi-o cantar numas gravações antigas de uma banda de death metal que tinha com o Marco há uns bons anos e apesar de ser algo antigo reparei que tinha um feeling e um registo mesmo como eu queria. Com isso, acabou por ser ainda melhor do que eu pensava na altura. Encaixou que nem uma luva na nossa sonoridade!

Até que ponto a banda conseguirá gerir o facto de não ter baterista e vocalista fixos?
A banda não vai estar activa no que diz respeito a concertos por muito tempo. Iremos estar a tocar apenas até Fevereiro de 2014. Depois disso, eu e o Marco iremos voltar a dar atenção aos Pitch Black. Não significa que não possamos fazer uma outra data isolada no futuro mas isto é mesmo (e apenas) um projecto paralelo. É verdade que temos tido um feedback maior do que pensávamos e, inclusive, temos já algumas propostas de editoras para um CD. Mas é algo sobre o qual ainda não nos foi possível tomar uma decisão, pois estamos a analisar todas as condições. No entanto, nada inviabiliza continuarmos a editar no futuro mas a minha prioridade irá ser sempre os Pitch Black.

Não significa então que o feedback positivo que têm recebido aumente a importância que possam dar ao projecto?
Não me parece provável que a banda possa vir a ser mais do que um projecto paralelo mas também nunca se sabe! As reacções têm sido excelentes. Principalmente lá fora onde temos chegado a imensas pessoas que se deparam com a nossa música e nos escrevem a dizer isso mesmo. Até temos mantido contacto com alguns músicos conhecidos que têm elogiado bastante o nosso trabalho. O Kam Lee (Massacre/Death) por exemplo, tem um programa de rádio onde passou os nossos temas e fez críticas excelentes à nossa música. Em diversos e-mails disse-nos até que há muitos anos que não ouvia algo assim dentro do death metal. Chegaram-nos propostas de editoras interessadas em lançar um longa-duração, por isso, tudo está a correr bem.

Nomeadamente o Zé Pedro é uma pessoa muito experienciada em termos de actuar fora de Portugal. Será este factor uma mais-valia para também levarem os Dementia 13 ao estrangeiro? Um pacote com Holocausto Canibal poderia ser aliciante...
Sim, isso é sempre uma hipótese já analisada por nós mas tem de ser pensada e planeada com muito tempo de antecedência. A vida em Portugal está cada vez mais difícil e as pessoas não podem simplesmente largar tudo durante uma ou duas semanas e ir lá para fora. Não é nada de difícil isso mas quando tens de coordenar a disponibilidade de cinco pessoas com empregos, então a coisa complica-se, principalmente nesta altura em que vivemos! Mas isso será sempre uma hipótese, claro.

Porque surge a ideia de aliar ao vosso som a imagética e a mensagem dos filmes de horror? São mesmo fãs dos clássicos ou é apenas uma forma de tornar mais tenebrosa a vossa música?
Somos mesmo fãs! Sempre gostei da associação do cinema de horror com o death metal. Até cheguei a fazer isso num tema dos Pitch Black mas não posso usar essa fórmula sempre, pois temos variadas abordagens temáticas nas nossas músicas. Mas numa banda de death metal como os Dementia 13 já posso e foi precisamente isso que fiz. É uma forma de homenagear o cinema de terror tal como o fazemos com o death metal mais clássico e, na minha opinião, é o género de metal mais adequado à temática implícita. Cada música nossa fala da própria história de cada filme e será sempre assim. Todos os temas vão obedecer a essa regra. Faz parte do imaginário dos Dementia 13.

Já agora, o que acha dos filmes de horror mais actuais? Muito "limpinhos"?
Demasiado "limpinhos", sim! Muito CGI nos efeitos especiais. Até o próprio sangue começou a ser feito em computador e acho isso ridículo. Mas, tal como na música, ainda conseguimos encontrar preciosas pérolas dentro do género de realizadores que são uma lufada de ar fresco. O cinema de terror americano está completamente ultrapassado (excluindo alguns esforços bem sucedidos mas mais underground). Por outro lado, pudemos assistir a um crescimento imenso em termos de qualidade no género do cinema francês, britânico, espanhol, dinamarquês, só para citar alguns exemplos. Tenho visto filmes surpreendentes originários destes países (e não só) enquanto que dos E.U.A. só vejo porcaria. Mas mesmo assim, continuo a preferir o cinema nos anos 70, 80 e 90, sem sombra de dúvida. Tinham uma magia única e um ambiente que sempre me fascinou. O mesmo se passou com o death metal. O avanço da tecnologia deixa as pessoas cegas, não entendo. É isso e o dinheiro e a fama.

Dos concertos que deram até ao momento, o Moita Metal Fest e o SWR Barroselas Metalfest terão sido os mais marcantes. Conte-nos como foi o ambiente e como se sentiu a banda nestas primeiras experiências ao vivo.
Foi muito bom! A receptividade foi excelente e leva-nos a crer que as pessoas gostam do som e estavam curiosas para ver a banda ao vivo. Pelo menos, a maior parte ficou até ao final dos concertos! [risos] Fizemos também uma data no Porto no Metalpoint e que teve casa cheia. Temos mais marcadas - em Castelo Branco, Ílhavo, Viseu, Coimbra, Viana do Castelo - e outras por confirmar. Vamos ver como vão correr essas.

Sentem que precisam urgentemente de editar mais material para poderem estar mais tempo em palco? Como está organizado o vosso set neste momento? As covers são um "mal necessário"?
Neste momento, temos set para uma hora de concerto, o que chega perfeitamente. Quando compusemos os temas para o EP a ideia era termos mais do que quatro para que pudéssemos escolher e, como tal, ficámos logo com repertório suficiente para tocar ao vivo. No que diz respeito às covers, temos quatro ao todo. Este projecto é, assumidamente, um tributo, não só ao cinema de terror mas também às bandas que caracterizaram o género na década de 90. Logo, as covers fazem e farão sempre parte. Nunca escondi as minhas influências e, por isso, não tenho vergonha de as referenciar. Por acaso, nunca fugi desse cliché como outras bandas inocentemente tendem a fazê-lo. Aliás, tenho orgulho nas bandas e discos que me influenciaram!

Depois do thrash e death metal parece haver ainda lugar no seu coração para um projecto doom. É possível revelar alguns detalhes ou pelo menos explicar quais são os objectivos?
Tu sabes tudo! Sim, é outro género que gostava de explorar. Não que seja um enorme fã de doom, tal como o sou de thrash, death metal ou hard rock, por exemplo, mas há bandas que realmente adoro. Não é o caso dos My Dying Bride ou dos Katatonia. Não gosto dessas bandas. Gostava de fazer algo na linha de uns Novembers Doom, Candlemass, Saturnus, Em Sinfonia, Black Sabbath ou Mourning Lenore. Riffs pesadíssimos, melódicos, simples e repetitivos era como eu gostava que fosse. Mas nada de concreto ainda e para já nem posso estar a pensar muito nisso.

Nuno Costa




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