Entrevista Colosso
GEOMETRIA TÓXICA
"Não sei se as pessoas estão preparadas para mudanças deste tipo, mas é aquilo que queremos fazer"
"Chocou"
o underground nacional há um ano com um portento de death metal progressivo
chamado "Abrasive Peace". Ainda mais surpreendente por ser idealizado
por um único cérebro e apoiado na bateria de Dirk Verbeuren [Soilwork]. Em
pouco tempo muita coisa mudou. Saíram suficientemente da sombra e o seu próprio
mentor, Max Tomé (entre outras coisas conhecido como a voz dos Holocausto
Canibal nos últimos discos) também reconsiderou o formato do projecto e
transformou-o em banda. Reconhece que é algo muito mais divertido e que nem as "salas
vazias" do país resfriam a sua vontade de subir ao palco. E para isso tem agora
um novo registo para apresentar. "Thallium" são "apenas" seis
temas, cerca de vinte minutos de uma viagem sinuosa pelos meandros de um metal
experimental baseado em ambientes sinistros e bipolares, com a técnica a ser apenas uma mero acessório para um mundo de complexas sensibilidades.
Curiosamente, tálio é um elemento
químico que se apresenta como um metal branco. Que relação tem o espírito ou
possível conceito deste disco com o seu título?
A utilização do título “Thallium” tem mais a ver
com o facto do tálio ser um metal altamente tóxico. Como este EP nos soa bem
mais obscuro que o primeiro álbum (tanto a nível musical como de letras), este
título pareceu-nos interessante e apropriado.
Pouco mais de um ano depois está de
regresso com os Colosso. Será que se pode falar em excesso de inspiração (uma
inspiração natural) ou a boa recepção a "Abrasive Peace" também potenciou
a criatividade?
É uma pergunta interessante, dado que os temas
presentes em “Thallium” foram compostos ainda antes dos temas do “Abrasive
Peace”. Apesar disto, como todos gostamos destes temas, decidimos fazer um
lançamento em que os mesmos fossem integrados.
Como havia anunciado recentemente,
este seria um trabalho ligeiramente diferente do seu antecessor. Não será um
corte abrupto em relação ao passado, mas talvez um aprofundar do
experimentalismo que poderá surpreender quem ainda tem "Abrasive
Peace" bem fresco nos ouvidos. Concorda? Acha que as pessoas estão
"preparadas" para "Thallium"?
Sim, estes novos temas abordam o nosso lado mais
experimental e era isso mesmo que queríamos fazer num segundo trabalho. Daí
termos “aproveitado” estes temas mais antigos. Sinceramente, não sei se as pessoas estão
preparadas para mudanças deste tipo, mas é aquilo que queremos fazer como banda
– álbuns relativamente distintos e diferentes entre si. Apesar disto, acho que se nota que é a mesma
banda, mesmo que alguma da ferocidade latente no “Abrasive Peace” tenha ficado
de fora…
Afirmou também há cerca de um ano
que este não seria um produto "feito industrialmente e já praticado por
milhares pelo mundo fora". Foi isto que levou "Thallium" a
seguir um caminho distinto e será essa imprevisibilidade/independência que
pautará os lançamentos dos Colosso?
Sim, era isso mesmo que queria dizer com essa
afirmação. Queremos explorar e misturar todas as nossas influências e tentar
que cada lançamento seja relativamente distinto dos anteriores.
Passando à questão da constituição
de banda, como tem sido trabalhar com os seus novos colegas e, sobretudo, as
maiores vantagens de deixar de ser a única mente - supostamente - a pensar em
tudo?
Tem sido muito bom! Tira-me montes de pressão e
trabalho de cima dos ombros! Além de serem todos músicos excepcionais, são
excelentes com ideias e na gestão da banda – algo que é essencial quando se faz
absolutamente tudo sobre o mote "do
it yourself".
Seria, à partida, pouco expectável
que Dirk Verbeuren continuasse a participar no projecto, única e exclusivamente
pela sua preenchida agenda. No entanto, conseguiu convencer-se facilmente disso
ou foi uma colaboração que pensava ser pontual desde o início?
Sempre tive a ideia que seria uma colaboração
pontual. Cheguei a pensar fazer vários álbuns com bateristas diferentes, mas
essa ideia caiu por terra assim que comecei a tocar e a trocar ideias com o
Marcelo Aires.
Ele já ouviu o trabalho?
Enviei-lhe uma cópia, mas (ainda) não obtive
resposta… Provavelmente passou-lhe ao lado, dada a agenda brutal que tem!
Por outro lado, como tem funcionado
os temas antigos agora que são tocados por vários músicos? Normalmente é
difícil evitar certos "tiques" naturais de cada um... Será que se
estão a preocupar em interpretar ipsis
verbis os temas de "Abrasive Peace"?
Não estamos muito preocupados em interpretar ao
limite aquilo que foi gravado. Conforme vamos ensaiando os temas vão evoluindo
e vamos adicionando pequenos novos arranjos que, na minha humilde opinião,
tornam os temas mais interessantes. Se temos algum objectivo na interpretação
dos temas ao vivo é tentar fazer com que soem melhor do que na gravação.
Continuando ainda a análise a este
novo formato de banda, recorde-se que afirmou em 2012 à SounD(/)ZonE que este
era um projecto de estúdio, até porque dizia estar "cansado de tocar para
salas vazias". O que o fez verdadeiramente mudar de ideias?
Não mudei muito aquilo que sinto, daí termos tido
muito cuidado a marcar concertos… Mas cansei-me, também, de tocar sozinho… é
muito mais divertido tocar em conjunto – apesar de todo o trabalho e tempo que
se tem que despender – e essa foi a principal razão para tentar formar a banda.
Consegue descrever as maiores características
dos seus novos colegas? Será que pensa: com o Marcelo vou ter mais dinâmica,
com o André vou ter mais groove, com
o António vou ter mais complexidade rítmica, etc.?
São todos músicos excepcionais e absurdamente
dedicados. O Marcelo Aires é dos melhores bateristas portugueses e tem mais que
potencial para se tornar dos melhores a nível mundial. O André Lourenço tem um
sentido de groove e melodia muito
raro hoje em dia. O António Carvalho é dos guitarristas ritmo mais talentosos
que conheço. Enfim, podia enumerar mais características, mas essas são as
principais. Além disto, e como já disse anteriormente, são uma grande ajuda na
gestão da banda! Não me canso de referir isto porque é essencial numa banda
underground hoje em dia.
Mais uma vez edita um disco dos
Colosso em nome próprio. Continua a ser impossível despertar o interesse de uma
editora ou simplesmente, tal como costuma referir, a indústria musical mudou e
isso já nem é relevante?
Um pouco de ambas… Pessoalmente, prefiro lançar os
discos em edição de autor. Dá-nos outra liberdade criativa (será que poderíamos
editar dois álbuns tão diferentes na mesma editora? Não sei…), e permite-nos um
contacto mais directo com quem gosta do nosso trabalho e nos quer apoiar. Como
banda, debatemos algumas vezes se deveríamos enviar o “Thallium” para alguma
editora, mas dado que se trata de um EP (e não de um álbum), a edição deste
parecia ainda mais complicada... A opção de lançar em edição de autor acabou
por ser a mais fácil e simples!
Sendo que "Thallium" está
disponível seguindo a filosofia "pay-what-you-want",
será que nos pode confidenciar se tem havido muita generosidade?
Sim, tem superado as nossas espectativas!
Obviamente que a maioria das pessoas que fazem o download não paga nada e existem algumas que apenas podem dar algo
simbólico, mas felizmente temos tido casos de generosidade inesperada – casos
em que pagam duas a três vezes o valor proposto pelo CD, já para não falar nas
vendas digitais… Agradecemos profundamente todos os donativos! São o maior
elogio que nos podem dar, muito mais do que palavras!
Em termos de promoção eventualmente
continua a tratar de tudo sozinho. No entanto, espera que "Abrasive
Peace" lhe tenha aberto portas e a tarefa se torne mais fácil? Ou espera
voltar a perder muitas horas de sono?
O “Abrasive Peace” fez com que criasse algumas dinâmicas
a nível de promoção que agora facilitam na promoção do “Thallium”. Apesar
disso, continua a ser muito difícil fazer-nos ouvir. São tantas as bandas a
nível nacional e mundial hoje em dia, que acabamos por ser mais uma no monte de
e-mails… É a grande desvantagem
relativamente a estar numa editora.
Nos próximos meses o que se espera dos
Colosso? Datas, outras actividades...
Estamos a agendar concertos em
Portugal, estando já formalizado um em Guimarães no Mass Execution Fest II, a 7
de Dezembro. Temos outros concertos e festivais em vista, mas actualmente ainda
é cedo para divulgá-los… Temos planeado também a gravação de
um vídeo de suporte ao “Thallium” e vamos tentar estar muito activos a
nível de concertos durante o resto do ano e em 2014.
Nuno Costa