FULLPOWER STUDIOS: entrevista com André Rodrigues
São uma jovem entidade na área da produção áudio em Portugal. Sedeados
em Braga, os FULLPOWER STUDIOS,
comandados por André Rodrigues, sugerem um espírito profissional, ambicioso e
exigente ao mesmo tempo que realista e generoso, tentando oferecer sempre as
melhores soluções para cada artista. Os NEBULOUS
- uma das revelações do metal nacional em 2013 - são uma das maiores pérolas a
sair do estúdio nortenho e seguem-se os THE
RANSACK. Entretanto, o seu líder, com sua aptidão e versatilidade, também já
produziu discos de fado e pop/rock e os seus clientes já extravasam as fronteiras nacionais.
Conheça toda a estrutura desta nova solução para os amantes de
gravações de qualidade.
Começou quando e porquê na área
da produção áudio?
Não sei precisar a data em que comecei a fazer as minhas primeiras
gravações, mas posso dizer que foi por causa de uma das minhas bandas. Isto aconteceu
há cerca de treze ou catorze anos e na altura queria gravar as nossas músicas
para tentar perceber o que estava bem ou mal… A partir daí nunca mais parei.
Investiu na formação académica
ou é autodidacta?
Não investi em formação académica. Sou completamente autodidacta. Aprendi
quase tudo sozinho e também tive colegas de trabalho que me ensinaram umas
coisas. Não investi nessa mesma porque acredito que lá nos ensinam a usar as
ferramentas que temos disponíveis para gravar, misturar, etc., mas não nos
ensinam a ser um bom produtor, nem a fazer grandes trabalhos de produção.
Hoje grande parte das pessoas
pensa que consegue gravar um grande álbum em casa. Mito ou verdade?
Eu arrisco no "mito". Grande parte das pessoas pensa que sim,
mas na verdade não consegue gravar um grande álbum em casa. Para além disso, há
uma série de variáveis a ter em conta para gravar um bom disco em casa... mas
isso já dava conversa para meia dúzia de entrevistas. [risos]
Não adianta termos bom material se não conseguimos perceber o que está a acontecer quando o utilizamos.
Alguém já afirmou: com bom
material "também se faz bom som" (não necessariamente). O ouvido é, e
continuará a ser, a maior arma dos grandes produtores?
Sem dúvida! Captar, misturar e masterizar exige um ouvido bastante
treinado e isso só se consegue com milhares de horas de experiência. Portanto, não
adianta termos bom material se não conseguimos perceber o que está a acontecer
quando o utilizamos.
Que engenheiros de som ou
produtores lhe servem de inspiração e porquê?
Ainda são alguns… [risos] mas os principais são Chris Lord Alge e David
Bendeth, porque fazem o tipo de produção que eu gosto. E se ouvirem os
trabalhos deles vão perceber que, apesar de terem abordagens diferentes, "sacam"
um som absolutamente incrível.
Método preferido/utilizado: analógico
ou digital?
Analógico e digital! Ambos têm os seus prós e contras, pois quando utilizamos
os dois, temos o melhor dos dois mundos.
O loudness é um mal necessário?
Preocupa-se com isso, com a dinâmica, a questão do "artificial vs.
orgânico" , com o K-System do Bob Katz, por exemplo?
Esse é um tema recorrente e que tem dado imenso que falar nos últimos
anos… Eu preocupo-me sempre com as dinâmicas, mas a verdade é que,
principalmente na cena rock/metal, a maior parte das bandas no estrangeiro tem
produções muito altas, porque desta forma as músicas parecem mais "potentes".
Consequentemente, todas as outras bandas vão atrás para estarem ao mesmo nível.
Se é um mal necessário? Talvez, porque a verdade é que a maior parte do público
ou não faz ideia do que estamos a falar ou também quer os discos a soar assim…
Eu tenho a certeza que sim. Toco (ou dou uns "toques") uma
boa variedade de instrumentos e, por causa disso, sei como é que eles funcionam,
como têm que soar. Assim sendo, automaticamente, sei como os devo captar e
misturar para chegar aos resultados que pretendo.
Bandas nacionais emergentes
[NEBULOUS] e mais experientes [THE RANSACK] já recorreram aos seus serviços,
mas o seu trabalho já chegou, entretanto, ao estrangeiro. Porque acha que apostaram em si e o que nos
pode relatar dessas experiências?
Eu acredito que foi pelo meu trabalho. As bandas a sério procuram um
estúdio pelo som ou pelo produtor, e não apenas pelo preço ou comodidade. Quando
trabalhas com grandes músicos, determinados, que sabem precisamente o que
querem e têm grandes músicas, a experiência só pode ser boa, no sentido em que
te sentes realizado por fazeres parte daquele trabalho, aprendes imenso e, para
finalizar, consegues um resultado final muito bom.
Os FULLPOWER STUDIOS,
aparentemente, oferecem mais do que as oportunidades "comuns" aos
clientes - incluindo drummer session.
Explique-nos, no fundo, aquilo que podemos obter através dos vossos serviços?
Nos Fullpower Studios trabalha-se com objectivos, sendo que o principal
é sempre "sacar" o melhor som possível para a banda. Portanto, quando
alguém vem gravar connosco, misturar ou masterizar, sabe que tudo será
explorado ao máximo para consigamos o melhor resultado possível. Estou
consciente de que não temos os melhores materiais do mundo mas também sei que
temos o suficiente e conhecimentos para fazer produções a um nível bastante
elevado. Baterista de sessão é um serviço que é necessário e que é bastante
utilizado no estrangeiro em bandas muito conhecidas. A minha experiência diz-me
que o "elo mais fraco" de uma banda é quase sempre o baterista,
principalmente no metal, e daí recorrermos a um baterista profissional sempre
que necessário e a banda assim o quiser, como é óbvio. Tem a ver com objectivos:
se queres um bom disco, tens que tocar bem; se não tocas é preferível pedires a
alguém que o faça por ti em prol de toda a banda e de um resultado final muito
melhor. Depende sempre dos objectivos e da mentalidade dos elementos da banda. Além
de baterista de sessão também temos o serviço de re-amp em que as bandas podem escolher amplificadores de marcas
como Engl, Diezel, Peavey, Marshall, etc., assim como as colunas.
A questão monetária é uma grande
preocupação para si ou em qualquer circunstância (uma vez que vivemos num tempo
de crise) a qualidade tem que ter um preço?
Eu entendo que a qualidade tem que ter um preço, mas já desci preços
uma vez ou outra e voltaria a fazê-lo se entendesse que a banda em questão tem
bom material e o estúdio vai sair a ganhar com isso. Contudo, a verdade é que
todos os meses me pedem preços e todos os meses há uma banda que não gravo
porque, pelos vistos, “sou caro”. Quando falo com bandas estrangeiras elas nem questionam
o preço. Em Portugal, as que o fazem normalmente são bandas que estão à procura
apenas de um estúdio para gravar. Em Portugal, os estúdios ao nível dos Fullpower
Studios, ou seja, com dimensões parecidas (quer a nível de salas quer de
material), praticam preços que variam pouco; já os resultados variam muito. É
sobre isso que as bandas se devem questionar: se andam à procura de preço ou do
estúdio que melhor as vai servir.
Em Portugal paga-se entre 2.000€ a 3.000€ por um álbum; lá fora paga-se de 10.000€ para cima…
Acha que as bandas optam cada
vez mais por gravar sozinhas por causa dos preços ou porque já não confiam no
verdadeiro papel de um profissional do áudio? É uma área a cair em descrédito?
Eu tenho a noção, porque também já passei por isso quando comecei, que
as bandas têm sempre a tendência de queixar-se ou tentar negociar um preço mais
favorável. No entanto, já há algum tempo que o tipo de cliente dos Fullpower
Studios vem cá gravar pelo som que "sacamos" e pela nossa forma de
trabalhar; portanto, não questionam absolutamente nada. Também é verdade que
cada vez mais optam por trabalhar sozinhas, pelo menos na captação, até porque,
hoje em dia, é barato e fácil gravar… o que não quer dizer que seja fácil
gravar bem! Já por duas ou três vezes que me enviaram material para misturar e
masterizar gravado pelas próprias bandas e não houve uma que estivesse com tudo
a 100%. Resumindo, ou as bandas têm alguém com conhecimentos suficientes e
condições para produzir um bom disco ou terão sempre que recorrer a um
profissional. No meu entender, as bandas vão cada vez mais recorrer aos
estúdios apenas para misturar e masterizar, mas também vão sair a perder.... Uma
banda precisa sempre, ou quase sempre, de um produtor.
Algumas bandas portuguesas já
começam a gravar no estrangeiro. Acha que vale a pena?
Valer a pena, vale sempre… Vão estar, em alguns casos, em estúdios por
onde passaram grandes bandas e com condições que nós aqui não temos, na cena metal!
Porém, há outro ponto de vista para isto: como todos podem ouvir, em Portugal tem-se
feito produções que não fogem muito ao que é feito no estrangeiro; aliás, às
vezes não fogem nada e, no entanto, não temos metade das condições que eles
têm. Se calhar a pergunta seria:
"vale a pena pagar cinco ou dez vezes mais para ter resultados
iguais ou nem sequer duas vezes melhor?" Acho que não… Em Portugal paga-se entre 2.000€
a 3.000€ por um álbum; lá fora paga-se de 10.000€ para cima… Se pagarem o mesmo
aqui vão ter resultados iguais! Em Portugal há estúdios com condições
fantásticas para fazer captações, ao nível do que se faz no estrangeiro, porque,
afinal, essa é que é a grande diferença: as condições, salas, material, etc. Isto
serve para dizer que podem sempre fazer captações, principalmente de bateria,
num bom estúdio em Portugal (por exemplo, os Boom Studios) e todo o resto em
estúdios ao nível dos Fullpower Studios que continuará a ser mais barato e o
resultado final estará, com certeza, ao mais alto nível.
Hoje em dia vale a pena gravar
um disco com alta fidelidade ou o advento do MP3 e a própria falta de "cultura
auditiva" da generalidade das pessoas nem exige muito esforço dos
produtores?
Continuo a achar que sim! Não importa se vais gravar com material e
salas no valor de um ou dois milhões de euros para no fim o público ouvir em phones de um euro. No final, vai soar
sempre melhor se gravarem com alta fidelidade, até podem não perceber porquê,
mas soa melhor. A minha "guerra"
é todos os dias tentar melhorar o trabalho que faço, quer o público dê ou não
importância a isso.
Acha que as bandas de hoje em
dia confiam demasiado nas vantagens tecnológicas para camuflar deficiências
técnicas? Isso reflete-se negativamente na qualidade musical e no mercado actuais
se comparados com os anos 70, 80 ou mesmo 90?
Sem dúvida, mas não se pode generalizar. Reflete-se em alguns casos, pelo
menos para o ouvinte mais atento. Não sentes o mesmo feel que sentes num disco dos Guns N' Roses, por exemplo. Contudo,
estas vantagens tecnológicas não fazem milagres; os músicos que tocam bem
conseguem sempre melhor som no final.
Considera-se especialista em
algum género ou sente-se apto/versátil o suficiente para produzir qualquer tipo
de banda?
Eu vejo essa questão de outra forma, isto é, acho que qualquer produtor
se sente mais apto a produzir o tipo de música que é mais do seu gosto, que no
meu caso passa pelo rock, metal, hardcore e todos os seus subgéneros. No
entanto, já gravei meia dúzia de discos de fado, pop/rock, entre outros, e
sinto que fiz um bom trabalho. De qualquer forma acho que, se a tua
"cena" são sonoridades mais pesadas, à partida vais fazer um trabalho
muito melhor do que, por exemplo, num disco de jazz e vice-versa.
Qual dos discos que produziu
aponta como referência e porquê?
Se calhar, neste momento, nenhum! [risos] Isto porque ainda vai sair
muito material em breve com exactamente o tipo de produção que quero e gosto. Todavia,
o que anda mais próximo é, sem dúvida, o álbum dos Nebulous que misturei e
masterizei.
No geral, qual o disco mais bem
gravado/produzido que já ouviu?
Não é fácil escolher apenas um. Aliás, não me parece que haja "um"
disco mais bem gravado que todos os outros, ainda que possa falar de alguns: Daughtry
(com o tema "Crawling Back To You") misturado pelo Chris Lord Alge, e
em estilos mais pesados os Katatonia, Of Mice and Men, Karnivool, Dimmu Borgir,
etc.
Que balanço faz do crescimento dos
Fullpower Studios até ao momento e que planos traça a curto/médio prazo com esse
empreendimento?
O balanço é bastante positivo, a todos os níveis. O estúdio cresceu em
popularidade, em material, condições e, acima de tudo, nos resultados ao nível
da produção. A curto/médio prazo vamos investir sempre mais em materiais e
condições para conseguirmos obter resultados cada vez melhores e, como as
próprias bandas o fazem, tentar cada vez mais chegar ao mercado internacional.
Nuno Costa