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NEOPLASMAH: entrevista exclusiva com Vitor Mendes

PROFETAS DA ESCURIDÃO


Os que andaram "por cá" no virar do milénio de certo lembrar-se-ão de uma banda extrema do Seixal que reunia argumentos para se tornar num caso sério no underground nacional. Contingências variadas colocaram um travão num percurso que começava a florescer, onde o black/death metal era interpretado com uma competência acima da média (estavam aqui só alguns dos melhores músicos nacionais dentro do género) e se destacava a prestação da vocalista Sofia Silva. Mas não há bem que nunca acabe nem mal que sempre dure e aí estão os NEOPLASMAH a reclamar devidamente o seu lugar com o álbum «Auguring The Dusk Of A New Era», dez anos após a estreia «Sidereal Passage» e sete desde o congelamento das suas actividades. Como reconhece o guitarrista Vitor Mendes, o "bichinho" voltou a morder e nem o facto de terem rebuscado temas compostos há longos anos (sujeitos aos devidos arranjos) invalida o significado acrescido que tem este regresso para a música nacional.  

Comecemos pelo que para muitos é uma incógnita: o que vos levou a desagrupar em 2004 quando até tinham um disco acabado de lançar no mercado?
Penso que sofremos daquilo que muitas bandas sofrem no underground nacional... tínhamos temas compostos desde 1999, todos por mim e pelo Simão Santos, e só conseguimos fechar a gravação do «Sidereal Passage» em 2002, já com o line-up actual. Ou seja, quando o álbum finalmente saiu, em 2004, a nossa vontade era começar a gravar o seguinte! Por essa altura, já tínhamos dado alguns concertos e composto um punhado de temas novos. Temos que admitir que o «Sidereal Passage» não teve, na altura, a atenção que o «Auguring The Dusk Of A New Era» está agora a ter, em parte, por culpa nossa. Tudo isso fez-nos, aos poucos, começar a derivar para outras prioridades e outros projectos e entrámos em hiato no início de 2005. Quando demos por nós, já tinham passado sete anos!

Como justificam então o vosso regresso em 2012? O sentimento de que algo tinha ficado por provar?
A verdade é que, entretanto, alguns de nós continuaram a tocar juntos e, de vez em quando, NEOPLASMAH voltava a surgir em conversa. Por volta de 2012 decidimos combinar umas cervejas e, a partir daí, tudo se desenrolou muito naturalmente... o nosso objectivo inicial era apenas gravar as músicas que já tínhamos, porque acreditávamos no valor do nosso trabalho. Depois, recebemos alguns convites para tocar ao vivo nesse ano e o "bichinho" começou a crescer... e a partir do momento em que a Helldprod teve interesse em lançar o álbum, percebemos que tínhamos todas as razões para voltar ao activo.
Tendo em conta que regressámos ao activo há pouco tempo (...), a reacção tem sido incrível e superou todas as nossas expectativas.
O que mudou essencialmente durante estes dez anos em termos de mentalidade e método de trabalho para os NEOPLASMAH?
Inevitavelmente agora temos outra maturidade e experiência. Isso permitiu-nos duas coisas: primeiro, durante a fase criativa, quando estávamos a gravar o álbum, acrescentámos arranjos, ideias e mesmo letras novas que fizeram com que este trabalho seja verdadeiramente "filho" de todos nós; segundo, dentro da banda existem agora papéis definidos e tentamos geri-la quase como uma empresa, porque hoje em dia todos temos outros projectos, vida familiar e profissional para conciliar, por isso, o tempo tem que ser muito bem gerido.

O processo de composição é resultado de um esforço colectivo ou o Vitor continua a figurar como a principal força criativa da banda?
Até hoje foram vários os projectos em que participei, mas penso que posso considerar NEOPLASMAH como o projecto onde posso criar música de acordo com a minha visão, sem barreiras de estilo ou quaisquer outras, sobretudo neste segundo álbum. E isto acontece porque existe entre todos nós uma consonância criativa que nos faz criar músicas não só de forma rápida como de forma consensual. Isto, com toda a certeza, não deve ser algo de que muitas bandas se possam orgulhar! Eu faço a matriz das músicas, mas é óbvio que sem o Zé [Marreiros, guitarrista - MARTELO NEGRO], o Alex [Ribeiro, baixista - GROG], o Rolando [Barros, baterista - GROG, SCENT OF DEATH, THE FIRSTBORN] e a Sofia na banda o resultado nunca poderia ser este. Relativamente às letras, quando a Sofia entrou para a banda foi não só por gostar do som, mas também da temática lírica e, por isso, foi apenas natural que continuasse a escrever letras dentro do mesmo tema.

É mais fácil escrever hoje em dia num cenário musical cada vez mais desenvolvido técnica e criativamente ou não se deixaram abalar por qualquer tipo de pressão?
É óbvio que existe pressão...felizmente temos cada vez mais e melhores músicos e bandas a surgirem no underground nacional! Isso deixa-nos orgulhosos do nosso país, mas acresce uma certa pressão, sobretudo ao vivo. Quanto a este segundo álbum, como disse, as músicas já estavam compostas desde 2004-2005, mas a verdade é que os arranjos que fizemos aquando da gravação, em 2012, com toda a certeza reflectem mais aquilo que ouvimos e que conseguimos executar agora do que apenas o que ouvíamos e tocávamos há dez anos. Por isso, talvez tenhamos imposto alguma pressão a nós próprios para fazer algo que transpusesse os limites do que tínhamos feito até então, mas encaro-a como uma pressão positiva!


Ter uma vocalista numa banda de death metal tem servido como trunfo para se distanciarem da "concorrência"? Como é trabalhar com a Sofia?
É verdade que fomos, provavelmente, a primeira banda de death metal em Portugal a ter uma vocalista, mas a Sofia entrou na banda não por estarmos à procura de uma vocalista feminina, mas porque estávamos à procura de uma pessoa que se identificasse com o nosso estilo e que o conseguisse executar. O facto de ser uma menina, no início até nos deixou apreensivos...mas logo que a conhecemos percebemos que não faria a menor diferença. Ela trabalha tanto como todos nós e encaixou perfeitamente na dinâmica da banda. Se isso entretanto funcionou como um trunfo para nos destacar das demais bandas...todos admitimos que sim, mas nem sempre resultou a nosso favor. Entre 2002 e 2005 não era fácil encaixar-nos nas expectativas de grande parte do público e isso abalou-nos na altura - mas não foi por isso que desistimos e a prova disso é que voltámos agora, com o nosso próprio estilo em palco, outra confiança e a convicção de que somos uma equipa, um grupo de amigos que gostam do que fazem.

A Sofia também experimenta registos limpos neste disco. A ideia foi manter a essência dos NEOPLASMAH mas injectar alguns novos elementos à sonoridade da banda? Até que ponto entendem que evoluíram?
Foi um desafio que colocámos à Sofia - ela sempre cantou noutros projectos, já antes de entrar para os NEOPLASMAH, e neste álbum, especificamente no tema-título, havia passagens que puxavam por algo mais do que guitarras. A voz limpa, do nosso ponto de vista, encaixa perfeitamente na música e veio acrescentar uma nova textura, mas manter a essência. Este álbum, apesar de ter músicas de 2002-2004, representa exactamente aquilo que somos como banda agora e a nossa evolução como músicos. Na altura em que gravámos o álbum não pensávamos ainda em lançá-lo e não nos preocupámos com a opinião de mais ninguém além da nossa. Agora que o álbum saiu, temos consciência de que existe o risco de os mais puristas não gostarem da inclusão de voz limpa num álbum de death/black metal. Porém, nem por isso vamos perder a convicção no nosso trabalho!

Tem sido curioso verificar a reacção de uma nova geração de ouvintes que nem sequer sabia que os NEOPLASMAH foram uma banda relevante no início do milénio? Como analisam o feedback ao vosso regresso até ao momento?
Tendo em conta que regressámos ao activo há pouco tempo, com apenas três concertos em 2012 e o recente concerto de apresentação do álbum no RCA, a reacção tem sido incrível e superou todas as nossas expectativas. De facto, além daqueles que sempre gostaram do nosso som desde o início e aos quais só temos a agradecer todo o apoio, surgem cada vez mais caras novas a seguir-nos e apoiar-nos, por vezes músicos jovens mas extraordinários, o que é para nós muito gratificante. Acima de tudo, é excelente ver que existe grande cooperação entre músicos, bandas e público, pois só assim é possível manter o underground vivo.

Mesmo que a aceitação do público não fosse positiva, como tem sido até agora, nós continuaríamos absolutamente realizados com este álbum.
Que pontos consideram mais distintivos entre este disco e o debutante «Sidereal Passage»?
Acima de tudo a qualidade do registo áudio. O álbum foi gravado e produzido por nós nos estúdios do José Carlos [aka Melkor] nos Studios 13 e misturado e masterizado pelo André Tavares, e o facto de termos agora à nossa disposição condições técnicas muito diferentes das que tínhamos há dez anos faz com que o resultado final seja muito melhor do que o primeiro álbum. Para além disso, sem dúvida alguma que neste álbum se nota a maior maturidade que temos como músicos. Ainda que os temas estivessem já todos compostos desde 2002-2005, novos arranjos foram feitos aquando da gravação. Além disso, apesar da temática das letras ser semelhante ao primeiro álbum, girando em torno de temas sci-fi e cenários apocalípticos, quem escreveu as letras para este segundo álbum foi a Sofia, excepto a «Ravishing Theatre of Chaos» que é da minha autoria. E isto aconteceu dentro do esquema actual da banda, em que cada um tem o seu papel e, para um vocalista, faz muito mais sentido interpretar aquilo que ele/a próprio/a escreve.

O próprio título do disco indicia uma vontade de virar uma página na carreira da banda. O que nos podem destacar mais em termos de mensagem?
O título do disco foi escolhido já durante a fase das gravações e conjuga duas coisas que nos pareceram importantes: primeiro, escolhemos uma música que pudesse servir de cartão de visita da banda e achamos que esta mostra na perfeição tudo aquilo que NEOPLASMAH é actualmente; segundo, e como bem foi referido, este é o virar de uma página na história da banda em que voltamos com toda a confiança para mostrar o nosso trabalho e a nossa nova atitude. É uma mensagem positiva, de determinação e confiança no futuro e significa apenas uma coisa: mesmo que a aceitação do público não fosse positiva, como tem sido até agora, nós continuaríamos absolutamente realizados com este álbum.

E com esta atitude renovada e todas as condições reunidas para voltarem à normalidade, quais são os planos que traçam para um futuro mais próximo?
Para já é, com certeza, continuar a mostrar o nosso trabalho ao vivo e em todas as plataformas actualmente disponíveis, e nisso temos todo o apoio da nossa editora Helldprod que tem sido incansável na divulgação e promoção do álbum. Além disso, vamos estar atentos a todas as janelas que se possam abrir...

E podem garantir aos fãs que não entram em hibernação tão cedo?
Para já estamos focados em promover este álbum e aproveitar todas as oportunidades que possam surgir. O resto, só o futuro dirá!

Texto: Nuno Costa
Fotografia: Hélder Soares



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