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CRÓNICA: Heavy Metal: vírus ou antídoto social?

Foto: PA
Não consigo esquivar-me ao pensamento de que a crise económica nacional (e mundial) é um mal necessário. Obviamente que esta não é uma manifestação de conivência para com a má gestão (corrupta?) dos nossos políticos, mas diz a nossa natureza que é em situações de grande aflição que o pensamento se agudiza e aumenta a capacidade de superação. Uma coisa já concluímos: algo esteve francamente mal do ponto de vista político, mas também moral, ao longo de décadas. E embora seja correcto atribuir-se maiores responsabilidades à classe política, também é conveniente reconhecermos que nem sempre cumprimos com os nossos deveres cívicos. Todo e qualquer indivíduo, independentemente da classe social, tem um poder enorme de influenciar o meio em que se insere. Basta que acredite nisso.

Nos Açores, nossa principal área de acção, grande parte das iniciativas culturais eram subsidiadas pelo Governo. Actualmente, por força do quadro económico (e aqui vem a parte positiva), entendeu-se que cada iniciativa teria que se tornar minimamente auto-suficiente e começou-se a praticar estratégias tão básicas como: cobrar bilhetes. Para espanto de muitos, ou talvez não, as casas continuam muito bem compostas. Tudo isso leva-nos a pensar que o antigo modelo estava a prazo - o modelo do facilitismo e do esbanjamento (também de alguns compadrios e lobbies se quiserem, e que continuam a haver). No entanto, a terapia de choque a que temos estado sujeitos tem o abono de corrigir certos procedimentos e colocar algumas ideias nos eixos.

Recorde-se que nos Açores nunca se respeitou uma realidade musical altamente condicionada pela insularidade e que estava em construção. Há cerca de 25 anos, quando tudo começou com os MORBID DEATH, definiram-se as bases e contribuiu-se de forma inestimável para o crescimento deste género na região. Posteriormente, e há cerca de dez anos, começaram-se a estabelecer pontes sólidas com um futuro que se chegou a adivinhar pródigo e exemplar. Contudo, nada nem ninguém sobrevive isolado e é necessário uma sociedade altamente consciente do seu papel (falhou-se em momentos chave). Levanta-se ainda a questão: afinal, para que serve esta cultura? Foi tudo uma questão de conveniência e de moda?

Actualmente, tudo indica que há um definhamento crítico deste movimento no arquipélago e mesmo que se fale em ciclos há alguns que eventualmente não se renovam. Sublinhe-se que o metal foi sempre mais do que música, ultrapassando o conceito tradicional de entretenimento. Como muitos sempre afirmaram: esta é uma forma de vida. Implica competências artísticas mas também um sentimento de intervenção (sempre saudável) que ou nasce connosco ou simplesmente não se cultiva. Nada disso tem que ver com o condicionamento das liberdades individuais. Aliás, este é o nosso bem mais precioso. A questão é de fundo: porque surgiu o deslumbramento e porque este se dissipou? Foi só a falta de apoios? A estagnação artística serve de justificação? Ela existe mesmo?

Entretanto, não deixa de ser triste verificar que certos exemplos (de pessoas e entidades) não foram suficientes para perfurar tão espessa camada de cepticismo. Para muitos, a solução é o conformismo perante as circunstâncias (boas ou más), muitas vezes sem uma pensamento próprio e quiçá transfigurando-se personalidades.

Pese embora o discurso pesaroso, o espírito é sempre optimista. Tem que haver a humildade suficiente para se perceber onde se errou e, verdade seja dita, tudo tem um lugar e uma hora certa para acontecer. Os ciclos são importantes; a reflexão não menos. Há situações actuais insustentáveis para o desenvolvimento desta actividade - nomeadamente nos Açores - e com isso urge perceber que medidas podem ser tomadas para se restabelecer alguma normalidade (serão os voos low-cost?). Seria justo perante a seriedade com que estes músicos trabalham, a mesma que a de qualquer outro músico de outro género musical. E sendo este um movimento que moldou muitas gerações, o que será das próximas sem ele? Uma questão que cabe a quem de direito estudar. Havia uma coisa que distinguia este movimento: a convicção, o respeito e a união. Não seria isto útil para resolver muitos dos problemas da sociedade actual? 

Nuno Costa

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