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LAUGHBANGING: entrevista com Paulo Rodrigues e Gustavo Vieira

GARGALHADAS A NEGRO

Gustavo Vieira [à esquerda] / Paulo Rodrigues [à direita]
Quebrar barreiras, mudar mentalidades, entreter. Paulo Rodrigues e Gustavo Vieira dividem a sua paixão pelo heavy metal e pela comédia no blogue LAUGHBANGING e, porventura, são até incompreendidos na forma como tentam "brincar" com um universo tradicionalmente introvertido e circunspecto. Mesmo assim, e sem complexos, levam os músicos a dizerem o que não diriam em mais sítio algum, o que coloca estes dois stand-up comedians num plano isolado da blogosfera nacional. Para trás estão ainda incursões pelo mundo da música propriamente dito (Gustavo Vieira foi membro dos FIRSTBORN EVIL), mas é na comédia que brilham e tentam marcar a diferença - assim, sem rodeios e regados de boa disposição. 

Dez anos a juntar humor com heavy metal seria um cenário pouco provável à partida. Que balanço fazem do vosso percurso?
Paulo Rodrigues: Agridoce! Por um lado, acho que não fomos tão prolíferos quanto podíamos ter sido; por outro, acredito que escrevemos coisas engraçadas, conduzimos entrevistas diferentes do habitual e o feedback foi maioritariamente positivo.

Gustavo Vieira: Tivemos um blogue e agora até temos uma página no Facebook. Estamos muito crescidos. Ok, talvez por esta altura pudéssemos ter chegado a mais pessoas, mas vamos mantendo o projecto activo, mesmo a passo lento. O que interessa é que ideias não faltam e que o projecto tenha estado activo este tempo todo, mesmo com a chata da "procrastinação" sempre a bater à porta.

O metal é mesmo um universo sisudo e conservador?
P.R.: Se é! E acrescentava hipócrita, também. Se não, reparem: há estômago para suportar capas como as de CARCASS, CANNIBAL CORPSE ou MARDUK, mas uma simples piada sobre o teu músico ou a tua banda favoritos é coisa para nos mandarem "pró c******", como já aconteceu. As coisas já foram piores, mas ainda há muita pedra por partir. Desculpem o pó!

G.V.: É curioso, porque o metal sempre foi um estilo de música de revolta e também de liberdade de expressão, onde de pode falar de tudo o que seja bom e mau, desde a crítica à sociedade, corrupção, serial-killers, dragões e espadas... Não há limites. A não ser, como o Paulo disse, fazer uma piada à tua banda favorita. E não devia ser assim. Há muita pessoa que precisa de ter mais sentido de humor ou, pelo menos, não levar isto tanto a sério.
Uma simples piada sobre o teu músico ou a tua banda favoritos é coisa para nos mandarem "pró c******"

Como olham para os acontecimentos mais polémicos da história do metal? A imagem de choque que se cultivou em torno do género tem justificação ou foi simplesmente amplificada para denegrir uma classe mais contestatária de músicos contemporâneos?
G.V.: O heavy metal é o estilo de música mais intenso que existe. Isto aplica-se à música, aos músicos e aos fãs. Não me surpreende muito os acontecimentos polémicos, mas há quem se aproveite deles para denegrir a imagem do género. Até podem falar mal do heavy metal, mas o que é certo é que já muitos géneros musicais apareceram e desapareceram num par de anos e o metal ainda continua por cá, de pedra e cal... ou a ferro e fogo... ou rijo como um pêro... ou outra coisa que queiram associar.

P.R.: Um pouco das duas coisas. De forma propositada ou não, o heavy metal sempre cultivou esse choque, a vários níveis. A música, que se recusa a ser quadrada e silenciosa, o dress code, em que todos os dias parece ter morrido alguém... é impossível não colidir com o que habitualmente se vê e ouve por aí. Depois temos aqueles episódios que nos envergonham a todos, que sim, são extrapolados até à exaustão pelos media que, como só nós, dão atenção quando alguém vira Sónia Brazão e passam a ideia de que o metal é coisa de malucos!

Sendo que Portugal é o país do fado, torna-se mais difícil fazer as pessoas rir? 
P.R.: Não, pelo contrário! Se olharmos àquilo que nos vem logo à cabeça quando pensamos em fado, desde o seu significado directo (destino), passando pelas temáticas saudade e sofrimento, tudo isto são ingredientes para uma boa piada. Se repararem, não há piadas sobre o quão realizada uma pessoa é profissionalmente ou sentimentalmente. É sempre ao contrário. Em Portugal, a dificuldade máxima em fazer rir alguém está em brincar com temas cujas pessoas em geral dão como sagrados - como a religião, o futebol e mais recentemente o cancro -, quando, a meu ver, tudo pode ser alvo de humor, desde que bem feito.

G.V.: Talvez até por este país estar assim nesta crise e haver tanta porcaria no Governo é que as pessoas mais necessitem de rir. 

O metal de imaginário nonsense acaba por ter alguns representantes em Portugal - casos dos COMME RESTUS, SERRABULHO ou QUINTETO EXPLOSIVO. Uma abordagem que merecia ser mais explorada?
P.R.: Sim, e bandas de drone metal também, pois tenho andado com insónias.

G.V.: Devia ser engraçado este concerto: QUINTETO EXPLOSIVO a começar para meter o pessoal a mexer-se, depois drone para pô-los a dormir e SERRABULHO no fim para acordar.

Há alguma banda - nacional ou internacional - que vos convença neste contexto?
P.R.: Apesar de não serem metal, sempre gostei do sentido de humor dos CENSURADOS, MATA-RATOS e PESTE E SIDA. Lá fora, TENACIOUS D, RATOS DE PORÃO e SORE THROAT. Os últimos álbuns dos METALLICA e MANOWAR também me fazem rir, mas por outros motivos.

G.V.: Gosto de bandas que tenham sentido de humor, daquelas que nos fazem rir, porque a música e as letras estão repletas de comédia. Bandas como MUCKY POP, S.O.D., M.O.D., WEHRMACHT, D.R.I., INTENSE MUTILATION...

Que figura da música mais vos diverte, sobretudo pela personalidade? 
P.R.: No meu caso, nunca foram personalidades, mas sim duas bandas em específico: DESIRE e CANDLE SERENADE. No caso dos DESIRE, costumo brincar com a lentidão da música. Por exemplo, ires a uma caixa multibanco e dares com um senhor à tua frente a pagar um molho de facturas. Para mim, isso é um momento DESIRE. Já CANDLE SERENADE, parece-me consensual que aquilo era muito mal tocado, pelo que sempre que vou a um restaurante e não gosto da comida, é caso para perguntar se há algum elemento da banda na cozinha.

G.V.: O Axl Rose, pelas atitudes e por estar décadas em estúdio a gravar um álbum com os GUNS N' ROSES que as pessoas depois esquecem em dois dias. Se for uma banda, os AGATHOCLES, por lançarem cerca de 50 splits por semana.
Talvez até por este país estar assim nesta crise e haver tanta porcaria no Governo é que as pessoas mais necessitem de rir. 

Aliar metal com humor era um pressuposto de inovação a nível de publicações ou simplesmente um passatempo que se tornou óbvio pelas vossas ligações a ambos os mundos?
G.V.: Surgiu por acaso, como passatempo. Sendo eu e o Paulo comediantes e metaleiros, surgiu naturalmente inventar piadas não só de actualidades e do dia-a-dia como também sobre o heavy metal. Porque, para nós, o heavy metal também é o nosso dia-a-dia.

P.R.: Um passatempo que se tornou óbvio pelas nossas ligações a ambos os mundos! Contudo, penso que acabámos por trilhar um caminho novo, diferente no que a publicações de metal diz respeito.

O que falta à maioria dos sites e revistas de metal actualmente?
P.R.: Tal como no metal, parece-me que tudo já foi inventado e a única forma de fazer alguma coisa nova é misturar, fundir com algo diferente, como acabamos por fazer com o humor. Quem diz humor, diz outras áreas. Estou a lembrar-me, por exemplo, de culinária, como acontece no canal de Youtube Vegan Black Metal Chef.

G.V.: Concordo!

Qual foi a entrevista que mais vos surpreendeu? 
G.V.: Para mim, foi a do escritor José Luis Peixoto. Além de ser uma personalidade conhecida e não ser um músico (mas já foi... leiam a entrevista aqui), aceitou prontamente o desafio, foi rápido a responder e entrou no espírito do Laughbanging. Apesar de já saber que ele é uma pessoa bem disposta, nunca pensei que tiraria parte do seu tempo para responder a perguntas idiotas vindas de dois malucos desconhecidos.

P.R.: Foram as entrevistas que ficaram e ficarão por responder! Primeiro, essas bandas disseram-nos que sim, que estavam interessadas em ser entrevistadas. Depois de receberem o nosso mail com as perguntas, desapareceram que nem um avião na Ásia.

Mantêm-se ligados à música enquanto intérpretes, mas eventualmente sem um compromisso muito rígido. É apenas um escape? Imaginam-se a fazer um projecto mais sério?
P.R.: No passado já tivemos esse compromisso mais rígido, pelo que é apenas um escape. Aliás, o gosto pelo metal até surgiu antes do humor, mas este último acabou por prevalecer.

G.V.: Já tive alguns anos em projectos sérios, mas se na altura já não tive muita paciência para continuar, não vou agora ter para começar. Sempre gostei de ser músico de heavy metal mais por diversão. Quando se torna muito sério, perde a graça. De vez em quando, gosto de ir compondo e gravando músicas muito esporadicamente com o meu irmão "Paulão" para a nossa banda de infância, os D.O.M.

Sendo que a indústria discográfica atravessa um momento crítico - ou pelo menos de mudança -, acham que esta é a altura certa para os músicos abordarem a sua actividade de forma mais descomplexada? Afinal de contas, o mercado não suporta tantas bandas e eventualmente é quase impossível voltar-se a fabricar ícones como os BLACK SABBATH, METALLICA ou LED ZEPPELIN. Que postura aconselham aos músicos, em especial aos nacionais?
G.V.: Mesmo já tendo sido quase tudo inventado e haver tanta banda, ainda pode haver mais ícones do metal. Há que criar algo novo ou refrescante. Em Portugal já houve fases em que todas as bandas eram iguais - não havia originalidade. E não sejam tão sérios. O heavy metal serve para nos divertirmos. Note-se os anos 80. A maior parte das bandas eram divertidas, bem dispostas e, apesar das dificuldades que havia, foi a década mais marcante deste género.

P.R.: Esta é pergunta mais difícil de responder! Se isto fosse o Preço Certo, esta era a montra final, não era? O único conselho que posso dar é nunca pedirem conselhos a humoristas. Nós até queremos que as coisas corram bem, mas secretamente até torcemos um bocadinho para que corram mal, só para que tenhamos matéria para parodiar.

Nuno Costa

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