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Entrevista Vertigo Steps

EMOÇÕES À SUPERFÍCIE
"O nosso som pode não ser simples de catalogar, mas já se torna fácil de reconhecer"

Poderíamos deduzir que um esforço colectivo seria sempre mais propício a um grande resultado. Mas para mentes como a de Bruno A. a introspecção "solitária" é a maneira mais eficaz de erguer um universo rock/metal de tendências progressivas e ambientais que atinge agora o auge da sua elegância no terceiro álbum dos Vertigo Steps - "surface/light". Hoje radicado na Alemanha, o seu mentor acedeu a contar-nos, entre muitas outras coisas, como é possível manter tanto potencial sem saltar para os palcos.  

Passados sensivelmente três meses desde a edição de "surface/light" que objectivos se podem dizer que foram alcançados até ao momento?
Penso que os objetivos principais a que nos propusemos estão plenamente cumpridos. Mas tudo o que ainda vier será bem-vindo, nomeadamente a nível de novos ouvintes, novas críticas e votações de final de ano, vendas e divulgação, etc..

Agora que estão ligados a uma editora - pela primeira vez - há também mais pressão e expectativas comerciais?
Não. Sempre acreditamos que qualquer um dos álbuns teria qualidade mais do que suficiente para ser editado profissionalmente. Acabou por se concretizar apenas ao terceiro, mas por motivos que pouco tem a ver com música.

A primeira grande ilação que se tira deste trabalho é que é bastante mais sereno e introspectivo que os seus antecessores. Depois de um "The Melancholy Hour" mais equilibrado e até radiofónico, este era o passo lógico a dar?
Concordo que foi um passo lógico e muito importante na evolução da banda. No entanto, está longe de ser um corte radical com o passado sonoro de Vertigo Steps. É tão somente um álbum mais equilibrado, coeso e bem conseguido a todos os níveis. O “The Melancholy Hour” também foi bem recebido e tem temas fortes e directos, e outros mais experimentais – não me parece todo ele demasiado radiofónico. Mas o “surface/light” acabou por resultar ainda mais catchy e apelativo. Naturalmente que não foi intencional mas a música foi saindo assim - por um lado fortemente atmosférica e emocional, por outro muito assimilável, orgânica e impregnada de earworms por todo o lado. Realço também o trabalho de produção. Penso que foi conseguido o feel mais solto e quente que pretendíamos.

Como foi compor levando avante a face mais melódica e ambiental do grupo? Muito diferente do que anteriormente? 
Precisamente igual. Limitei-me a seguir o instinto natural e desta vez os temas saíram em catadupa ao longo de meio ano, e todos com um nível que não me permitiu deixar nada de fora, apenas aproveitar o que ia fazendo e irmos aperfeiçoando até estarmos realizados com eles. No nosso caso, na maioria das vezes isso não tem a ver com complicar em demasiado a nível de estrutura, tempos ou técnica, mas sim em encontrar a textura sonora perfeita, a atmosfera ideal, a nota de piano ou mellotron mais adequada a cada secção, o que normalmente acaba por ser também um processo rápido. É um álbum com diversas texturas e camadas, novos detalhes que se vão revelando a cada audição.

Neste momento já se torna difícil identificar o som dos Vertigo Steps, pelo menos no plano mais tradicional do rock/metal. Será isso uma vantagem ou desvantagem, particularmente em termos comerciais?
Sinceramente, não é nada que me preocupe. Mas do meu ponto de vista será, ou deveria ser, sempre uma vantagem ouvir uma banda com personalidade e som próprios, não colada a outras bandas ou estilos e que trilha o seu próprio caminho. Hoje em dia há cada vez mais gente a referir-me que basta ouvir algumas notas para saber que se trata de Vertigo Steps. Considero isso, sem dúvida, muito positivo. Caso contrário, seríamos apenas mais uns – e já há bandas a mais de qualquer forma, tornando-se difícil descobrir as poucas que valem efectivamente a pena. Em suma, o nosso som pode não ser propriamente simples de catalogar ou descrever, mas já se torna fácil de reconhecer.

Nesta fase, a banda é um produto mais fácil de expandir, nomeadamente no estrangeiro, até porque contam com várias colaborações internacionais?
Penso que sim, haverá apenas que fazer essa aposta de forma empenhada.

Como classifica o contributo dos vários e ilustres convidados deste disco? Quer contar-nos como se estabelece o contacto?
Tal como nos trabalhos anteriores, dou importância e valor às colaborações. Neste caso, foi uma honra ter o Jan Transit [In The Woods...] – que não é propriamente conhecido pelas muitas participações especiais que aceita – e o Patrik Karlsson, talento ímpar sueco ainda pouco conhecido. E, como repetentes de sempre, o Stein R. Sordal que canta a cover “Nothing At All” com a habitual inspiração (talvez a melhor participação dele até à data) e a Sophie que continua a emprestar o seu talento a vários detalhes que dele necessitam. De resto, o núcleo duro constituído por mim e o Niko [Mankinen], mais o Daniel [Cardoso] mantém-se.

Incontornável é também a forma como é produzido o videoclip para "someone (like you)". A sua simplicidade pode criar alguma estranheza a início, mas não deixa de ser uma ideia inovadora. Não se tratou simplesmente de um "cartaz" turístico da Noruega, certo?
Conforme acabaste de alvitrar, cartazes turísticos é no departamento ao lado. A simplicidade de que falas é umas das virtudes do vídeo. Trata-se de uma simplicidade enganadora e penso que quem já se cruzou com a nossa abordagem visual, lírica ou musical, poderá facilmente inferir significados bem mais profundos das imagens, em articulação com a letra e as próprias melodias. Mas também não serei certamente eu a levantar aqui o véu, prefiro deixar isso à interpretação pessoal de cada um. É um vídeo muito bem conseguido, para um tema bastante especial e que foi extremamente bem acolhido, até mais do que esperava inicialmente.

A forma mais melancólica como resultou este disco é também um espelho de um estado de espírito diferente, algo interior ou exterior, atendendo à fase crítica em que vive o mundo?
Bem, essa é uma questão pertinente, mas para a qual não tenho resposta. A música sempre me saiu melancólica, hoje como há dez anos atrás, e o mundo está em constante mutação. Há sempre problemas, só que se vão alternando, enquanto uns se agravam e outros permanecem, por vezes dissimulados em novas e podres roupagens... Há sempre muito para contemplar e reflectir, mesmo que as letras sejam mais pessoais e intimistas que abertamente políticas ou de intervenção social. Espelham mais uma relação com o mundo, revoluções interiores, do que as próprias convulsões sociais.

Também descreveu este álbum como algo de uma "grandiosidade cinematográfica". Quando compõe, o grande objectivo é, sobretudo, criar imagens na mente dos ouvintes?
Penso que isso é mais uma consequência natural do que um objetivo premeditado. Quando componho não me proponho a nada que não seja a por cá fora a música que me assola e esperar que algumas pessoas a possam apreciar. Mas penso que há nela uma componente atmosférica e cinemática tão grande que qualquer ouvinte com bom gosto e imaginação fértil facilmente fará os seus próprios filmes, mal os primeiros sons sejam emitidos dos altifalantes.

Pelo que nos é dado a saber, os Vertigo Steps continuam como um projecto de estúdio. É fácil manter o entusiasmo sem o contacto directo com público? Há planos para alguma alteração nesse sentido? 
É algo que nos perguntam sempre, mas tem funcionado assim e assim continuará. O entusiasmo vem da música nova que fazemos e também das reações dos ouvintes. Neste momento, não há quaisquer planos concretos noutro sentido.

Consta que está neste momento radicado na Alemanha. Como músico o que acha que isso lhe tem transmitido, por exemplo em comparação com a realidade portuguesa?
É verdade, mudei-me em Junho para Berlim e já cá tinha vivido em 2009. Como músico em particular, não sei, mas como indivíduo, sem dúvida que é algo marcante. É uma cidade de tal forma ímpar no mundo que é impossível não ser afectado pelas inúmeras experiências que aqui se vivem diariamente. Não sendo particularmente ligada ao metal, é uma "Meca" de artes e há sempre música por todo o lado. Passo todos os dias por uma pitoresca ponte onde nunca vi menos que uma ou duas bandas de músicos de rua a tocar. Em 2009, vivi cá antes de gravar o “The Melancholy Hour” e isso influenciou-o a nível de abertura e novas ideias. A ligação à cidade marca-me como pessoa e, por extensão, a música que faço. Há sempre eventos, festivais, festas, dinamismo. E há ainda a componente dos concertos – a maioria dos quais passam ao lado de Portugal (e a SoundZone nas ilhas sentirá ainda mais isso). Deixo aqui apenas um exemplo, para finalizar: fora os que já vi desde que cheguei (Swans, Her Name Is Calla/The Pirate Ship Quintet, God Is An Astronaut, etc.), apenas durante Novembro vindouro tenho os seguintes agendados: Katatonia (com Alcest & Junius), GY!BE, Caspian e Anathema.

Nuno Costa


Leia também:
Review: "surface/light"
Review: "The Melancholy Hour"

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