Entrevista - Roger Tullgren
Tornou-se um fenómeno de popularidade. A história
insólita do sueco de 47 anos Roger Tullgren, a quem foi concedido um subsídio do
Governo por ser considerado "dependente" do heavy metal, correu o mundo e certamente
que configurou o desejo de muitos amantes do género. Hoje em dia já não recebe
qualquer benefício, mas consegue conciliar perfeitamente a vida profissional
com o gosto musical, e atingiu um estatuto de quase socialite que o permite ser convidado para muitos concertos. Com
tantas questões por desvendar, fomos ao encontro de Tullgren que nos explicou
como é possível ter tanto coração para viver o metal 24 horas por dia.
Deixe-nos manifestar primeiro a
nossa "satisfação" por termos conseguido fazê-lo estar alguns
minutos sem ouvir metal. A não ser que tenha algum som por perto enquanto fala
connosco...
Estou a ouvir Crematory e Prosecutor, uma banda de death/black metal de
que faço parte.
Estamos certos que há uma
multidão ansiosa por saber muitos detalhes sobre si. Mas comecemos pelo início:
quando e como começa o metal a revelar-se um "problema" na sua vida?
Em 1990, quando no emprego começaram a perguntar-me se havia algo mais
para além do metal e a que concertos ia, e aos que devia ou não ir.
Mudou de emprego no ano passado
e, como tal, já não está a receber qualquer subsídio do Governo. Sente mais
dificuldades em arranjar emprego depois de que a sua história se tornou famosa?
Não tenho problemas nesse aspecto. Trabalho neste momento, mas apenas
quatro horas diárias. Logo, resta-me muito tempo para ouvir música. Tenho
autorização para ouvir metal e posso pedir um dia de folga caso um concerto se
realize longe da minha localidade. Trabalho numa moradia e travo contacto com
muitas pessoas de diferentes religiões e com gostos musicais diversos. Mas
passo o tempo todo a falar de metal.
E como consegue trabalhar e
ouvir metal agora que não trabalha na cozinha de um restaurante mas sim em serviços
de limpeza?
Tenho um quarto na cave do apartamento em que trabalho com um sistema
de som e um leitor de MP3. Por isso, não há problema.
Será que consegue recordar-se de
alguma história curiosa com algum dos seus patrões?
Quando trabalhava no restaurante, os Lordi venceram o que aqui chamamos
de "melodifestivalen" com o tema "Hardrock Hallelujah". Os
meus ex-colegas gostam de outro tipo de música mas adoram o
"melodifestivalen". Portanto, eles detestaram que os Lordi tivessem ganho.
Posto isso, gravei um CD com 26 temas deles e à segunda vez que o coloquei a tocar
todos me queriam "matar". O meu patrão disse "agora estás a
divertir-te", ao que respondi "sim". Então ele ameaça-me: "colocas
mais uma vez o CD e vais para casa"! E assim tive um dia de folga! [risos]
Quando diz que ouve metal 24
horas por dia, está-se a referir literalmente?
Tenho colunas em todos os cantos da casa. Por isso, sim, oiço metal 24
horas por dia.
Em relação ao que ouve, dá
prioridade aos seus favoritos ou também procura música nova e de vários
estilos?
Dou sempre prioridade às bandas de que gosto realmente, mas tento ouvir
novidades. Normalmente oiço-as quando estou no comboio ou no carro. A banda
mais recente que ouvi chama-se Santoro, tocam stoner e lançaram novo material
em 2013.
Deixe-nos adivinhar: toda a
gente lhe oferece discos no aniversário ou pelo Natal?
Não me oferecem discos, mas sim caveiras e todo o tipo de coisas
relacionadas com o metal, como pins e óculos, sobretudo do Ozzy Osbourne e dos
Black Sabbath.
Qual acha que foi o maior
benefício pela sua história se ter tornado popular? O metal ficar mais
conhecido e respeitado, com as pessoas a aperceberem-se melhor do que é a devoção
dos seus apreciadores? Chegou alguma vez a receber dinheiro com, por exemplo,
campanhas publicitárias?
No meu percurso conheci pessoas que nunca ouviram falar de metal antes
de eu começar a surgir na comunicação social. Por isso, penso que hoje em dia
mais pessoas conhecem o hard rock e o metal. Temos que gostar mesmo deste género
para saber como é vivê-lo como uma religião. Já facturei algum dinheiro, mas
não muito. Mas o que me deixa mais satisfeito é o facto de me ligarem de
festivais para que eu marque presença, inclusive nos backstages. E tudo o que querem é que eu seja eu mesmo.
Acha que seria possível acontecer
o mesmo noutro país?
Tenho falado com todo o tipo de pessoas, até com cargos na política, que
me dizem que nos seus países a lei não permitiria tal coisa. Por outro lado, algumas
estrelas de rock lendárias dizem-me que se trata de uma boa ideia. Mas não
acredito que outros Governos tomassem a mesma decisão.
Também é sabido que alguns
psicólogos condenaram o seu caso. O que diria a essas pessoas ou até mesmo a
outros metaleiros que gostariam de ter o mesmo privilégio?
Essa é uma pergunta difícil. Tenho sempre uma postura directa e digo
sempre o que penso aos meus patrões. Penso que é importante seguirmos sempre a
nossa consciência, a partir do momento em que achamos que estamos correctos.
Como se sentiria se ficasse sem
recursos para consumir música? A ressacar?
Já tive momentos em que não tive meios para obter música, nomeadamente
quando era novo. Felizmente, tenho praticamente sempre dinheiro para ir a concertos
e a oportunidade de conhecer pessoas e bandas que me permitem ter sempre
contacto com a música.
A quantos concertos já assistiu
em 2013? Está disposto a bater o recorde do ano passado (mais de 300 concertos)?
Ainda não fui a muitos porque fui operado ao coração e continuo a
recuperar. Por isso, este ano assisti apenas a dez.
Em que estado se encontram as
suas bandas?
Toco guitarra nos Papa Midnite e temos dois concertos, para já,
agendados em festivais. Para além disso, contamos participar em outros de menor
dimensão. Neste momento estamos a trabalhar com um novo vocalista americano e
no próximo Verão vamos para estúdio.
Quem momentos elegeria como os
melhores da sua já longa vida como metaleiro?
Quando beijei a Doro Pesch... mas é-me difícil dizer, foram muitos.
Beber cerveja com o Bruce Dickinson [Iron Maiden], ver o Vinny Appice (na
altura nos Heaven And Hell) a deixar uma sessão de autógrafos só para falar
comigo sobre metal, ter estado no backstage
com os Mr. Rock e Avalanch em Madrid, beber chá com o Dio...
E qual será o seu tema ou álbum favorito?
É uma questão difícil. No
hard rock diria que é o "Black Sabbath" e no heavy metal o
"Number Of The Beast". Quanto aos temas, os melhores do mundo
para mim são "Life Won't Wait" do Ozzy Osbourne e "Alas de
Cristal" dos Avalanch - oiçam só as letras. Mas é difícil escolher um
tema. Eu gosto desde o hard rock dos AC/DC ao death metal mais extremo dos
Vital Remains.
Sabemos que começou a ouvir
metal com os Black Sabbath. Como se sente agora que eles estão prestes a editar
um novo álbum com o Ozzy?
Muito entusiasmado! Quero comprar o disco mesmo que já lá não esteja o
Bill Ward.
Nuno Costa