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Música bafienta

Desde a segunda metade da década transacta, a nostalgia pela música dos anos 60, 70 e 80 instalou-se entre os melómanos. Inevitavelmente, a indústria fonográfica aproveitou a tendência e lançou no mercado um sem-número de álbuns nunca editados em CD, com especial incidência nos best of’s, antologias e outras compilações biográficas.

Para acrescentar valor a esses álbuns, datados na sua intemporalidade, os grandes selos discográficos remasterizaram-nos e adicionaram-lhes faixas inéditas, temas ao vivo, diferentes versões de temas conhecidos, demos, encartes generosos com notas dos próprios músicos, posters, fotografias originais, capas e booklets com grafismo alternativo ou até mesmo faixas multimédia, a par de outros conteúdos, para seduzir os coleccionistas/completistas. Isto sem referir as edições em formato DVD de cassetes VHS com espectáculos e telediscos, vulgo videoclips, que tantos milhões de fãs levaram ao rubro nos anos 80, essencialmente, quando o boom do audiovisual modificaria para sempre a indústria.

Perante o music business afiguravam-se então dois mercados paralelos, extremamente apetecíveis e rentáveis, aguardando avidamente para serem explorados: de um lado os jovens da época, do outro os seus filhos e sobrinhos. Os primeiros acorreram em massa às discotecas (nome pelo qual dantes eram conhecidas as lojas de CD’s) para readquirirem, agora em formato digital, os álbuns que marcaram a sua juventude; os segundos, desencantados pelo alegado défice qualitativo da música contemporânea – e habituados que estavam a explorar o baú de memórias discográficas dos progenitores - reconheceram no ambiente revivalista o contexto ideal para descobrir outras “pérolas” que escreveram a história da música em geral e do Pop/Rock em particular.

O que, inevitavelmente, se traduziria em monumentais volumes de vendas, com os principais discos a escalarem aos lugares cimeiros das tabelas de vendas em todo o Mundo. Mesmo as sucessivas caixas retrospectivas e outras edições de luxo (necessariamente limitadas e acessíveis a poucos), em digipack duplo ou triplo, esgotaram-se num abrir e fechar de olhos. Tudo isto em plena crise gerada pela distribuição ilegal de música sujeita ao pagamento de direitos de autor através das platafromas P2P (peer-to-peer), de que o Napster se tornou o exemplo mais mediático.

Daí até à fundação de estações radiofónicas (Rádio Nostalgia ou M80, em Portugal) e canais televisivos temáticos (por exemplo, o norte-americano VH1) incidindo nestas épocas foi um passo. Afinal, havia que rentabilizar ao máximo e promover convenientemente esses fundos de catálogo junto de um público que exigia muito mais do que CD’s ou DVD’s. Não demorou muito até que o passo seguinte fosse dado: a reformação de bandas míticas, décadas após o seu desaparecimento.

Num monumental esforço para compensar as magníficas fortunas perdidas com a partilha ilegal de ficheiros, essas bandas e respectivas editoras, bem como promotores e restantes agentes da indústria discográfica, vêem acumulando lucros monumentais à custa de um público fácil de levar, cuja insuportável nostalgia o impede de perceber que, não raras vezes, se limita a ver em palco as suas bandas favoritas a arrastarem-se penosamente, numa vã e ridícula tentativa de replicar momentos irrepetíveis.

Paralelamente à indústria milionária em que se tornou o regresso ao activo de velhas glórias (ou a reformação de line-ups originais há muito desavindos) o mercado das bandas-tributo e de grupos de covers aumentou exponencialmente, levando artistas de todo o mundo a dedicar a sua carreira a replicar a obra das grandes glórias musicais. Uma pequena parte do impressionante número deste género de grupos existente por todo o mundo encontra-se para mostra em sites como www.tribute-band.com, www.tributecity.com, www.tributebands.com, www.tributebandreviews.co.uk ou www.gig-guide.co.uk/b.php/tribute-bands/5.

Existe de tudo: boas bandas, magníficas bandas, bandas assim-assim, bandas ridículas e outras verdadeiramente miseráveis, que não deviam sequer existir. Há grupos-tributo para todos os gostos e géneros musicais que, em muitos casos, vivem facilmente do trabalho original das suas musas inspiradoras ou obtém dele um confortável complemento aos empregos ditos normais dos seus elementos (regressarei ao tema num artigo futuro de forma aprofundada).

No fim de contas, e baseando-nos na realidade geral retratada neste texto, não deixa de ser deprimente que, actualmente, e desde há mais de uma década, a uma parte esmagadora da música produzida no Mundo tenha que se inspirar constantemente num passado longínquo e bafiento (mas sempre apetecível e rentável) para manter a indústria de pé, não deixando réstia de espaço à inovação, à originalidade e à novidade, enveredando pela ganância facilistista. Tristes tempos estes.

Dico

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